Na pele de samaritanos e samaritana

E quando via aquela mulher,
era invariável que pensasse: é possível que uma pessoa goste de viver com
aquelas roupas disformes, já nem se pode chamar simplesmente decote o que deixa
os seios totalmente à vista ao contrario da cintura extremamente apertada para
deixar ainda mais exuberante a segunda parte do tronco ao qual ela imprimia
movimento provocativo entre os homens e igualmente iradas as respectivas
mulheres. Entre estas, ao menos cinco, já haviam passado pela experiência de
ver seus maridos rumarem para a casa dela e se instalarem como se igualmente
donos fossem até que um dia se cansavam das facilidades que lhes proporcionava,
pela convivência promíscua e se lembrando das próprias esposas, de como era
melhor a vida com elas, de como ali ao lado da esposa e dos filhos, sentia todo sabor do que é uma família segundo os
preceitos de Deus, contristados, alguns
pedindo perdão, voltavam, nem sempre recebidos de braços abertos, mas também
sem um mínimo de hostilidade que pudesse causar qualquer constrangimento. Eram
recebidos de volta e pouco a pouco tudo voltava a ser como era antes.
Ao saber de cada caso
sempre me vinha a vontade de ir à casa dela e dizer “poucas e boas”, mas também
chamando-lhe a atenção para que não se esquecesse de que havia um Senhor que a
tudo via e nunca ficava satisfeito com o pecado que ela habitualmente cometia.
E passava o resto do meu
dia remoendo aquelas ideias, ensaiando palavras que nunca lhe disse e deixando
crescer em mim toda a decepção, toda hostilidade que a certo ponto também
percebi quanto tempo me fazia perder, como se tornava minha
companhia onde quer que eu fosse, durante o que fosse ou o que eu estivesse
fazendo.
E se encontrasse um grupo
de outras mulheres que lhe dirigiam insultos ao vê-la passar ou indo buscar
água no “Poço de Jacó”, não vacilava em me juntar a elas repetindo em coro as
palavras que de tanto se repetirem eram sequenciais: adúltera, tomadora de
marido dos outros, vadia, sem moral,
suja, vai embora daqui e nos deixe viver em paz. Você é um estorvo na nossa
vida, não a suportamos mais, vê-la não se diferencia de uma visão demoníaca:
“vai-te para os quintos do inferno”.
E quando escorraçada, sem
outra alternativa, disparava em carreira de volta para sua casa, também sem
segurança, mas era a que tinha.
Muitas vezes até
ajoelhando-se, chorava copiosamente, sem lamentar-se, não entendia do que
devesse fazer, não compreendia porque no entanto, era dada a insinuar-se para homens e foi assim
que tomou maridos de ao menos cinco delas.
E eu ficava pensando. Moro no mesmo lugar que ela, pode aceitar
viver a sua própria vida, sem incomodar ninguém, porque prefere ser pecadora,
prostituta, irresponsável, aderir a uma vida fácil porque com aquele pouco que
recebia dos homens conseguia manter-se.
Até aquele dia, em que ela
chegou esbaforida dizendo a todos que
encontrara o profeta, um judeu que nunca vira antes, que sabia de toda a sua
vida.
E juntei-me àquela pequena
multidão que acreditou em suas palavras e rumou em direção ao “Poço de Jacó”
onde, debaixo daquela árvore conhecida, encontramos o Cristo que ali estava e
entretinha-se com seus discípulos.
Aproximando-se conversaram
com Ele e se encantaram com o que ouviram até que Jesus demonstra ser chegado o
momento de retomar o caminho, tendo ouvido que suplicavam: “não te vás, Senhor,
fica conosco ao menos uns dois dias”.
E Jesus ficou hospedado na
casa de alguns samaritanos assim como seus discípulos. E com sua pedagogia do
amor mediante a qual os havia atraído sem que percebessem, foi-lhes ensinando.
Dizem depois à samaritana: ‘Primeiro nós acreditamos no que você nos contou.
Agora acreditamos no que ouvimos”
A partir de então me
descobri pensando nos fatos, a partir do dia em que a samaritana foi vista em
Sicar pela primeira vez. Chegou tendo nas mãos apenas uma trouxa que a avaliar
pelo volume, continha bem pouco. Depois de andar errante de cá e de lá,
descobriu aquela casa abandonada onde aventurou-se entrar. Disposta a sair se
alguém reclamasse a propriedade o que não aconteceu e ela continuou ficando.
Se se juntasse aos adoradores
de Deus era escorraçada dali por não ser digna.
Nem água no poço podia ir buscar
livremente, porque era hostilizada de todas as formas. Em vista desta situação
foi constrangida a sair ao sol do meio
dia, quando todas as outras mulheres o evitavam devido ao grande calor. E
sacrificada depois de encher o cântaro tomava penosamente de volta, o caminho
de sua casa.
Foi portanto uma grande
surpresa, ter sido exatamente através dela que o Profeta de propósito passou
pela Samaria, sem nenhum temor de sofrer qualquer ataque pelo fato de ser judeu
e pelo que tudo indica, para encontra-la.
Com ela, mediante um fato
quase indiferente, pedir de beber, travou um discurso de atração, de conquista,
não havia possibilidade de não dar certo porque no desígnio de Deus, como está
escrito: “ninguém vem a mim, sem que tenha sido
atraído pelo Pai”.(Jo. 5,44).
Quando então Ela pediu de
tal água, chegou o momento central do que aconteceria. Vai chamar seu marido e
volta com ele aqui, disse Jesus. Mas eu não tenho marido. respondeu. Jesus se revela: você disse a verdade
nem este que está com você agora é seu marido.
Para saber assim do seu
passado, outro não podia ser senão o Profeta divulgado e esperado e seu
primeiro impulso foi sair em disparada carreira e ir contar aos outros sua experiência.
Converti-me?
Enquanto Jesus ainda era
hóspede dos samaritanos coloquei-me em reflexão profunda e fui reconhecendo que
não tinha exercido o dom da hospitalidade em relação àquela mulher; não matei
sua fome, não lhe dei o que comer nem com que se vestir, mas me juntei a turba
todas as vezes em que se reunia para escrachá-la,
para diminui-la, para fazê-la sentir-se a última das pessoas, sem nenhum
direito, sem voz e sem vez. E é como se me fosse dado um grande tapa na cara ao entender que ninguém tem
o direito de julgar ninguém, ninguém pode se omitir de fazer pelo outro, tudo
do que for capaz de fazer, de ajudar de todas as formas, de ver na pessoa do
outro Javeh ultrajado.
E assumi no meu corpo toda
sua indigência para tentar provar tudo
que sofreu em nossas garras, todas as humilhações pelas quais passou, tudo que
ouviu de triste, enfim do ter provado a mais forte ausência de caridade de que
o ser humano desajustado, sem amor, é capaz.
E como me doeu! E como me
entristeceu! E como provei do quanto é triste viver em solidão, de não ouvir de
ninguém uma palavra de carinho, proporcionar um afago, por ninguém se sentir
amada.
ENCARNO-ME
DE VOLTA
Jesus foi o maior dos
Mestres. No curto espaço de sua vida terrena, pelo bem que fez foi logo
condenado à morte, não sem ter proclamado em todos os termos a BOA NOVA do Pai,
sua missão.
Ensinou com exemplo e
palavras o que significa vivenciar o primeiro mandamento e o segundo que a ele
é semelhante.
2°Amarás a teu próximo
como a ti mesmo.
Relevo alguma vaidade
demonstrada pela Samaritana, seu prostituir-se, nunca sozinha, porque não há
prostituída, sem prostituidor. Como condená-la na sua ignorância se no meu
saber também nem sempre me comporto segundo a moral, o direito e a justiça.
Não há outro caminho, o
caminho para ver e ouvir qualquer samaritana, todas as samaritanas de onde
vieram ou estão, passa pela
misericórdia.
Esta obrigação assume
novos contornos, se agiganta, quando a pessoa aceita Cristo e a Ele consagra
toda sua vida, fazendo por acréscimo, uma promessa de caridade.
Marlusse Pestana Daher