terça-feira, 2 de julho de 2013

FUZILEIROS NAVAIS

A chegada do Português Rodolfo Tavares Gomes.
Uma história da mata nativa do Gomes e da Lagoa Guanandy em Itapemirim-ES.
 Bárbara Peres
 
  Uma velha história narrada pelos descendentes portugueses que vivem na região sul capixaba. Eles chegaram no século passado a
o litoral sul, na divisa entre Marataízes e Itaoca-ES , e foi ali, às margens do Rio Itapemirim que divisa com as águas do mar do Pontal, que a tripulação dos familiares do “Gomes”, juntou-se a outros tripulantes que vinham em seus navios vapores explorar as terras  capixabas, entraram em nossas exuberantes colônias de pescadores. Por certo, passou pela Ilha dos Franceses, que ainda não havia sido batizada por esse nome, a mesma veio chamar-se Ilha dos Franceses após a invasão dos franceses no século passado que ali ficaram para as batalhas de guerra. Na ilha dos franceses existe água potável e uma gruta que se chama “Gruta do Beco” e reza a lenda que, ali, nesta gruta, existem tesouros escondidos bem ao fundo, por onde alguns pescadores e aventureiros se arriscaram adentrar para explorá-los, porém, todos que atribuíram estes ofícios foram encontrados mortos, sendo causa mortis asfixia pulmonar.    O comandante desta destemida tripulação era o português Rodolfo Tavares Gomes, que ancorou seu “vapor”, nome dado naquela época ao grande navio de tripulantes no Porto Trapiche, em Barra de Itapemirim.  Depois vieram a descoberta das areias da praia do Soto, cuja origem ainda é desconhecida, em frente às margens da atual fazenda do Gomes.


   A luta pela sobrevivência, a disputa das terras, foi travada em uma guerra entre os portugueses com os índios já habitantes da mata nativa. A região era habitada por diversas tribos indígenas, todas pertencentes ao tronco Tupi; as tribos do interior eram chamadas de Botocudos, sendo-lhes atribuídos comportamentos hostis e belicosos, além da prática de antropofagia. No litoral, as tribos também eram hostis, porém de hábitos um pouco diferentes, persistindo a pratica de antropofagia. Existia naquela época ao entorno da lagoa Guanandy inúmeras taperas indígenas (ocas), ali os botocudos cultivavam grandes plantações da árvore Guanandi para alimentarem-se de sua saborosa frutas, mas também a utilizavam para colorir (camuflar) suas caras a fim de esconderem-se dos invasores portugueses. Também cultivavam uma vastidão enorme de figueiras. Estas plantações sofreram a devastação do homem, ainda existindo ao entorno da lagoa Guanandy, algumas destas árvores, hoje preservadas, mas ainda sofrendo as perseguições do homem que teimam em destruir, desmatar e sujar toda aquela área. Podemos ainda ver, atualmente, um gesto humanitário, pois o senhor Juarez Gomes, conserva o hábito de ir quase todos os dias visitar a lagoa para cuidar e limpar, retirando os lixos ali deixados pelas pessoas que insistem  com o péssimo hábito de jogar seus lixos nesta área tão linda, de preservação ambiental, que enriquece todo solo capixaba.
     Foram meses de luta travada entre os Portugueses e os índios que ocupavam a grande mata nativa em toda área ao redor da lagoa, porém, desta luta saíram vencedores os portugueses, pois trouxeram muitos armamentos, munições, e  para capturar os índios, armavam pelas grutas das matas, grande quantidade de arapucas fabricadas de bambus e esses índios eram domesticados, como aconteceu com Dona Maria Correa, a índia  trabalhou por longos anos como cozinheira dos portugueses e morou por muitos anos em sua tapera indígena, perto da lagoa,  quando seu filho a levou para morar em Itaipava-ES, falecendo com seus 103 anos de vida e  seus restos mortais foram depositados no cemitério de Itaipava-ES.
    Fato estranho e curioso é que a índia Dona Maria Correa jamais degustou o precioso café, comia em abundancia uma planta conhecida como losna (de gosto amargo), seria um costume indígena? Ou apenas um velho hábito alimentar de sua própria autoria? O fato real é que dona Maria Correa durou 103 anos de vida saudável. Outro epílogo importante na vida desta Índia é que ela teve apenas um filho de nome Indígena: Floro e de sobrenome Correa, cuja paternidade desconhecida, imaginam-se alguns de seus descendentes que deveria ser fruto de um romance, o velho “pula cerca” da índia com um dos portugueses, fato nunca concretizado, apenas suspeitas.
  Outro índio capturado em emboscadas nas matas do “Gomes” pelos portugueses foi o senhor Joaquim Lotero, domesticado para os serviços braçais. Trabalhou arduamente na construção de casas e de estradas, estas,  existem até os dias de hoje. As estradas eram cortadas por enxadões pelos índios e escravos trazidos do continente africano. Os portugueses ordenavam que matassem  bois e arrancassem  os couros para transportar a terra vermelha na fabricação das estradas, pois ali nesta área era muito arenosa e era preciso utilizar as terras vermelhas das encostas das matas para consertar as estradas e conservá-las. Os couros dos bois eram curtidos em sol trópico e estes eram utilizados para serem puxados pelos homens ou burros treinados para cargas pesadas, trazendo as terras vermelhas em formação das estradas que duram até os dias atuais.
  O senhor Joaquim Lotero casou-se com uma bela espanhola, Josefa, que também veio atracar nas areias do famoso bairro da Barra de Itapemirim, pelas margens do rio Itapemirim. Desta união nasceram oito filhos. Uma história importante do senhor Joaquim Lotero é que ele deixou um fato contado por ele próprio, que transcende gerações: contava que ele jamais iria comer carne de porco, esta carne de gosto adocicado, pois lhe fazia recordar dos portugueses capturados pelos índios que eram assado e escolhido as carnes mais suculentas para a degustação, saciando a fome dos índios. (Atualmente, por acaso desconhecido ou ironia do destino, degustamos um dos melhores vinhos de fabricação portuguesa, o delicioso vinho do porto). Os índios domesticados pelos portugueses eram chamados de Caboclos. Mas antes de serem capturados e domesticados, os índios Botocudos fabricavam suas taperas ao em torno da lagoa Guanandy, também construíam suas canoas da madeira da figueira plantada por eles, tanto para pescar quanto para utilizar e puxar as terras vermelhas das encostas para produzir o barro, que inserido entre as esteiras de trançados de folhas em palhas secas (paineiras, sapé, enfaro, entulho), fabricavam as paredes de suas taperas. Até pouco tempo atrás existia algumas dessas taperas ao redor de toda lagoa, como entre as matas nativas.    Estes mesmos índios para esconder-se dos invasores de terras, usavam a tinta arroxeada da árvore Guanandy para colorir as caras (camuflar) na tentativa de não serem descobertos pelos portugueses, assim toda área da lagoa florestada pelas figueiras e pelas árvores de Guanandy, que hoje leva este nome da planta indígena, uma herança dos nossos primeiros habitantes da mata atlântica. É notório a nossa divida com os primeiros habitantes do planeta chamado varonil Brasil.
  Os portugueses chefiados por Rodolfo Tavares Gomes ganharam a guerra, apropriando-se da grande quantidade de terras e matas e os poucos índios que sobreviveram foram usados para o trabalho doméstico e braçal. Então os portugueses foram construindo suas moradias, inclusive construíram cinco casarões bem altos, pois dos alpendres podiam avistar toda região da mata, o mar e a ilha que atualmente chama-se ilha dos franceses após a invasão dos franceses. Também construíram a capela Nossa Senhora da Penha, que dela hoje só resta uma enorme trinca (fechadura), pois tudo era construído para proteção de invasores, esta relíquia é guardada pelo senhor Juarez Gomes, a recordação desta igreja que existiu ali entre as matas do “Gomes”. Para construírem suas casas, igrejas e tulhas de guardar mantimentos, eles matavam baleias que vinham em grande quantidade atracar nas areias da praia de Soto, retirando o óleo para misturar ao pó de conchas que produzia uma formula mágica, para emboco das paredes de suas construções. Os portugueses também construíram um enorme casarão “torre chaminé” para fabricação de açúcar e cachaça de excelente qualidade. Consta-se que eles iam viajar em seus “Vapores” para o continente em busca dos negros para o árduo trabalho e levavam grande quantidade de carnes de caças (tamanduá bandeira, perdizes, capivaras, cutias e outras espécies.) e também a saborosa cachaça de fabricação própria, para atrair os negros, pois chegando lá no continente eles faziam uma grande festa atraindo os escravos para o evento festivo e assim atraí-los, para trazê-los para suas terras em busca da fartura de comida e bebidas, assim a mão de obra escrava era atraída para o litoral sul capixaba como para as matas em nossa região.
     Atualmente a lagoa Guanandi é um ponto turístico de Itapemirim-ES, visitada pelos turistas, banhistas, curiosos e até mesmo biólogos afins de estudos científicos, pois suas  águas são de cores de chocolate (Coca-Cola), sendo que foram constatados o  precioso valor medicinal destas águas, tanto para a pele, como para os cabelos, sua cor ferrugem deixa no corpo humano uma maciez incrível e nos cabelos um excelente tratamento capilar.  Existe um lençol freático que em épocas das cheias,  banha as enormes pedras lodosas (moledo) com até oito quilômetros de distância, um precioso limo escuro, retirando delas a ferrugem que dá cor as águas da lagoa Guanandy, há também um estudo sobre as grandes quantidades de raízes das árvores de Guanandy e figueira que podem liberar suas tintas e misturar as águas, fatos estes, que fazem da lagoa uma excelente fonte de riqueza para o ser humano, além da beleza que nos proporciona ao visitá-la e banhar em suas deliciosas e escurecidas águas, uma fonte de saúde escondida bem ali às margens da rodovia entre Marataízes e Itaoca-ES.
    Anos após essa invasão aconteceu também por aqui a invasão dos franceses, motivo este, que a ilha habitada primeiramente pelos índios, hoje é batizada por Ilha dos Franceses. Consta-se também que os portugueses dominaram esta invasão, não existindo notícias se há franceses nesta região. Os casarões em meio às matas, que serviam de vigílias, as munições, armamentos, tudo foi útil para combates os invasores franceses e até a enorme igreja de Nossa Senhora da Penha que, se existisse ,contaria aos seus fiéis toda batalha humana que seus anjos testemunharam ao longo dos anos pelas matas dos Gomes.
  Existe na ilha dos franceses além de água potável, uma gruta conhecida
como “gruta do beco”, onde reza uma lenda que existe ali grande quantidade de ouro e moedas, escondidas pelos franceses.   Certa vez, ainda não muito distante, um pescador pelo nome de Samuel aventurou-se pelas profundezas desta gruta na tentativa de enriquecer-se com o ouro e as moedas, mas sofreu uma embolia pulmonar vindo a óbito logo após sair com ajuda de pescadores da gruta da Ilha dos Franceses.   Dizem as lendas que ninguém até os dias de hoje conseguiu alcançar a tão famosa sala de tesouros escondidos. Será que ainda tem pessoas que se habilitem a tal proeza? Porém a Ilha dos Franceses é um belo cenário para os turistas que tem o privilégio de visitá-la em seus passeios nas escunas de Itaoca e Itaipava-ES em épocas do verão capixaba. Também na “ Gruta do Beco” foi encontrado pelo pesquisador Augusto Ruschi, o “morcego prego”, que só existe nesta gruta da Ilha dos Franceses.

  Sua preservação é mantida pela Capitania dos Portos com a manutenção de suas luzes mecânicas do belíssimo farol, pela Marinha do Brasil. Ao entorno da Ilha dos Franceses além das escunas de passeios turísticos há uma grande quantidade de barcos de pescas, por onde os pescadores tiram daquela região  seus sustentos familiares.
   Entre esta verídica história contada pelo senhor Juarez Gomes (bisneto do primeiro Gomes) a habitar nessas regiões de vales, matas, lagos, praias cheias de mistérios e lendas, em uma realidade fantástica, há um ponto de partida e chegada, pois bem narrado em fatos verídicos, este ponto de partida é a história real dos nativos índios e os portugueses, primeiros habitantes da área em narração de forma lírica, numa guerra para conquistar o solo capixaba. O ponto de chegada é a entrada da Marinha do Brasil nas famosas terras do ‘Gomes’, que veio beneficiar as duas cidades bem mais próximas: Marataízes e Itapemirim, como outras cidades do sul capixaba e seus distritos.  Antes da marinha do Brasil adquirir de forma legal esta localização, foi uma obra primordial às pessoas, pois ali, carros eram esquecidos, tornando-se um cemitério de carros abandonados,
prostituições, ponto de drogas, abandonos de corpos assassinados, e  muitas vezes aconteciam incêndios nos carros com corpos abandonados, assassinados dentro dos veículos e jogados nas matas do “Gomes” bem ali, entre as praias e as matas com sua vegetação preservada. Este ato de vandalismo era chamado por aqui de “área de desova” de criminosos e traficantes.
 A rodovia silenciosa que a tudo observava com os olhos piedosos ante esta trágica realidade do completo abandono e desprezo das autoridades competentes, ficava na lírica lembrança do passado glorioso dos nossos índios formosos cuidando de nossas matas brasileiras. Nossa história termina no ponto de chegada: a Marinha do Brasil realizou a compra das terras do “Gomes” Empresário Romildo Coelho e do Professor Lauro Freire. (grande parte desta área já é parte integrante da união), hoje motivo de orgulho para as duas cidades vizinhas e também para todo o nosso litoral sul capixaba. Esta história como todas as histórias sempre tem um final feliz, o povoado do distrito do Gomes é um povo bonito, feliz, realizado como em todas as histórias. Os Gomes descendentes e herdeiros das terras doaram grande quantidade de terrenos ao poder público para construção de escolas, igrejas, quadras esportivas e etc.
    É hoje apesar da devassidão cruel do homem, ainda resta beleza nas matas nativas do Gomes. Existem bichos de várias espécies, inclusive macacos de diferentes raças, aves silvestres e exóticas. Por entre as trilhas e estradas que dão acesso a outros distritos, consequências de mãos de obra dos índios botocudos e escravos que viviam nas matas e em nossas praias, podemos caminhar e desfrutar das riquezas ambientais que só existem nas matas nativas do Gomes.
  Quando os carros blindados da Marinha do Brasil passam em suas rotinas de treinamentos, podem seus tripulantes avistar as pedras “o Frade e a Freira”, um dos pontos turísticos mais almejados em nossa região. Hoje a guerra é apenas uma simulação que os Fuzileiros Navais travam em suas missões de treinamentos por entre as trilhas das matas, nos distritos, principalmente entre as trilhas deixadas pelos índios e portugueses e no distrito tão exuberante com sua história digna de respeito como o do “Gomes”. As árvores, plantas exóticas, resistiram ao tempo e permanecem assopradas pelos ventos praianos vindos da Ilha dos Franceses em confronto com as águas do Rio Itapemirim e as da Lagoa Guanandy. O vento envereda-se pelas matas e rios como quem canta as canções dos índios e como multiplicador das matas levando junto aos pássaros em revoadas, as virtuosas sementes que fincam no chão varonil capixaba. E brota, e recomeça uma velha historia de beleza e esperanças. Variedades de macacos veem aos galpões e cerrados bucólicos ao entorno dos prédios da Marinha do Brasil, saborear as suculentas bananas e outras espécies de frutas, que os soldados buscam na natureza exótica e selvagem, composição deste cenário inatingível aos olhos de Deus. Do início do Bairro Pontal ao entorno das matas dos Gomes, podemos vislumbrar beleza e audácia da criação Divina que a humanidade posterior deverá preservar para que as raízes culturais permaneçam ao longo dos anos na exuberância da beleza pintada pelo artista anônimo que em caminhadas silenciosas revive as mais trágicas lutas sanguinárias de um passado não glorioso que ainda nos permite alcançar da tragédia, uma colônia exuberante de pescadores, das mulheres tecedoras de sonhos e de redes, dos homens, ainda que cruéis, tecem no olhar artístico  uma vastidão de plantas que compõe o cenário do litoral sul capixaba. Tecem e pescam na eminência de um futuro que ainda em sonho seja glorioso.
Oxalá renasça homens de boa vontade que jaz sobreviver à terra prometida. Adentramos as matas nativas e suas restingas, vislumbramos esta terra prometida e nos permitimos na sensibilidade, ouvir no silêncio do vento açoitado, o clamor dos índios em suas batalhas pela sobrevivência do solo e matas que os criaram na essência de mãos divinas, ouviremos então as lamentações das duras penas de nossas impróprias inconsciências. A Lagoa Guanandy, o Rio Itapemirim, a Ilha dos Franceses, matas e restingas pedem socorro e clemência na vã desobediência do homem. Oxalá pagam as nossas duras penalidades no confronto de nós mesmos com as abstinências e a imoralidade da degradação do ambiente que nos fora emprestado às duras chibatadas e mortes pelos Deuses e Índios, (brasileiros).
Aqui estamos, reunidos em nome da sobrevivência humana, assaltando os nossos conceitos éticos-morais e as nossas matas virgens... O velho e escasso Iambú ainda pia solitário pelas matas, há quem diga que em algumas noites escuras ,quando vimos do lado de Itaoca,ao passarmos pela Rodovia, avistamos ao curto percurso, uma sombra de mulher com seu vestido branco impecável, atravessando vagarosamente a rodovia, sempre no mesmo trecho, com o mesmo desfilar vagaroso em um único percurso, dizem ser assombração. Ou quem sabe a nossa própria vã inconsciência oprimida pelo antepassado. Miragem de uma índia saudosa ou reflexão de um familiar dos velhos Gomes?Caso ou causo é que o fato é verídico contado por alguns moradores ou viajantes que passam em noites escuras na travessia da Rodovia do litoral sul.
 Esta história real, acreditamos que para um final completamente ordenado e feliz, pediríamos à Marinha do Brasil, acrescentar na entrada de Apoio Administrativo de Itaoca-ES, entre as matas nativas, com letras bem grandes, um outdoor: ADSUMUS!
 
Adsumus-termo em latim usado pelos Fuzileiros Navais (Aqui estamos);
Fatos narrados á autora pelo Senhor Juarez Tavares Gomes em 2010;
 Trecho extraído do livro “Fuzileiros Navais suas Missões em Marataízes” de autoria de Bárbara Pérez.