É certo que, segundo enquete recente, a
maioria do povo se disse favorável à redução da
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Salvador Bonomo |
maioridade penal. Porém, acho
que há, aí, mais emoção que razão: efeito da grande violência que grassa o País
e da sua simplicidade. Se o Congresso vier a reduzir a maioridade penal, que é,
hoje, de 18 anos, tal proceder encartará ato ilegal ou, no mínimo, temerário,
pois a lei, por si só, não combate a violência.
Senão, vejamos.
Quando se editou a Lei de Execução Penal (nº
7.210|84), afirmou-se, uníssona e enfaticamente, que, se cumprida, resolvidos
seriam os graves problemas já reinantes no nosso Sistema Carcerário. Ledo
engano! Por falta de políticas públicas adequadas e gestores públicos
competentes e honestos, o referido Sistema se transformou no oitavo círculo do
Inferno de Dante Alighieri (Divina Comédia), o que reconhecera o próprio Ministro
da Justiça, ao dizer que preferiria a morte a ser preso nele. Resumo: ineficiência
do poder público!
O mesmo fracasso, pelas mesmas razões,
ocorreu com o Estatuto da Criança e do Adolescente. Aqui, em regra, quando o
Adolescente se conflita com a lei, o Promotor finge que propõe ao Juiz que lhe aplique
medida socioeducativa, o Juiz finge que a aplica, o Adolescente finge que a
cumpre e o Executivo finge que fiscaliza o seu cumprimento. Quando internado, o
Adolescente, em regra, é tratado como os presos adultos, pelo que, há muito, o
Internato, também, já virou o oitavo círculo do Inferno de Dante: escola de criminalidade.
Síntese: ineficiência do poder público!
Em virtude da histórica e incontestável ineficiência do poder público,
inevitável será, também, o fracasso na execução do Estatuto dos Idosos, pois,
para a efetivação dos seus direitos, só se vislumbram, até aqui, medidas meramente
paliativas!
Quando da informatização dos serviços públicos - em particular do
Judiciário – pregou-se, à saciedade, que, com tal inovação tecnológica, sanada seria
a história e crônica morosidade da Justiça, pois, há quase um século, fora,
incisivamente, denunciada por Ruy Barbosa (“Oração aos Moços”): “Justiça atrasada não é justiça; senão
injustiça qualificada e manifesta”.
Ledo engano!
É assustador saber que, segundo dados estatísticos, apenas 10% dos crimes
de homicídio, praticados por adultos, são apurados no País. Logo, 90% deles
encartam impunidade! Daí a pergunta: não seria mais lógico zerarmos a
impunidade dos adultos, antes de criminalizarmos os Adolescentes?
Sendo público e notório que enorme é a influência das drogas na
criminalidade, inclusive envolvendo grande número de menores, não seria mais lógico
que zerássemos o tráfico, antes de, ilegal e temerariamente, criminalizarmos os
Adolescentes? Ou é melhor continuarmos a “enxugar gelo”, com a adoção da
inconsequente e desgastada ideia de que as leis agravadas, por si só, são
capazes de debelar a criminalidade? Ora, se assim fosse, não haveria crime,
onde vigora a pena de morte!
É preciso que o Poder Legislativo, numeroso, oneroso, ineficiente e
inapto, seja submetido a profundas modificações para que exerça, efetivamente, as
suas reais funções: legislar e fiscalizar, sem “o toma lá dá cá”.
É necessário que o Poder Executivo, inchado, perdulário, ineficiente e oneroso,
sofra, também, profundas mudanças para executar, a contento, as suas verdadeiras
funções: ofertar, em tempo hábil, bons serviços à população, excluindo, de uma
vez por todas, a politicagem do “pão e circo”.
É imperioso, também, que o Poder Judiciário, moroso, oneroso e ineficiente,
sofra profundas mutações para que, especialmente expulsando a morosidade e
eliminando a impunidade, distribua, em tempo razoável, a verdadeira Justiça,
antes que se criminalizem os Adolescentes.
Na pretendida redução da maioridade penal para criminalizar os
Adolescentes entre 16 e 18 anos, vislumbro um só fundamento: o obscurantismo
retrógrado. Ao passo que, sob a ótica da razão, vislumbro o psicológico, o
biopsicológico, o político, o econômico, o social, o cultural e o jurídico.
Relativamente
ao fundamento jurídico, sustento que é inadmissível a redução da maioridade
penal dos Adolescentes de 18 anos (inimputáveis: art. 228 da CF|88), pois tal
fator encerra direito e garantia individuais (art. 5º, § 2º, da CF|88), que, por
encartar cláusula pétrea (art. 60. § 4º, da CF|88), não pode ser abolido, senão
por uma nova Constituinte.
Relativamente à
inimputabilidade dos menores de 18 anos, prevê o artigo 228 da CF|88: “São penalmente inimputáveis os menores de
dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.”
Assegurando a tais Adolescentes direito e garantia individuais, assim reza
o § 2° do art. 5º da CF|88: “Os direitos e garantias expressos nesta
Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados,
ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja
parte.”
Por seu turno, estabelece o inciso IV do § 4º do art. 60 da CF|88 que “Não
será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: IV – os
direitos e garantias individuais”.
Mas, infelizmente, sou compelido a afirmar que, no Brasil, não se faz
Política na acepção própria do termo, que, sendo uma ciência, tem como escopo a
promoção do bem-estar da população. Faz-se, isto sim, Politicagem, que é a sua
negação, pois atenta contra o mais importante princípio constitucional, que é o
da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III, da CF|88).
Concluindo, afirmo que, se o Congresso Nacional vier a reduzir a maioridade
penal dos Adolescentes, agirá ilegal e temerariamente, em virtude da histórica
ineficiência do poder público, pois, com muita frequência, tem sido comandado
por gestores incompetentes e desonestos, em razão do que têm espancado, de
morte, os Princípios Constitucionais da Legalidade, Moralidade e Eficiência!
Salvador
Bonomo.
Ex-Deputado
Estadual e Promotor de Justiça aposentado.
Vitória,
ES, 25.03.2014.