domingo, 27 de março de 2016

O QUE É A CNBB

O BISPO DE GUARULHOS AFIRMA: A CNBB NÃO TEM AUTORIDADE NENHUMA SOBRE OS BISPOS

André F. Falleiro Garcia

     O Bispo de Guarulhos, D. Luiz Gonzaga Bergonzini, fez recentemente esta declaração: "A CNBB não tem autoridade nenhuma sobre os bispos". Ele está coberto de razão. Já dissemos isto quandotratamos da natureza jurídica eclesiástica e limites de competência da CNBB, no artigo "A CNBB não é a Igreja Católica".
O Bispo de Guarulhos, D. Luiz Gonzaga Bergonzini 
     Com efeito, cada Bispo, Arcebispo ou Cardeal que compõe em nosso país a Sagrada Hierarquia da Igreja Católica, mantém relação de vinculação hierárquica direta com o Sumo Pontífice sem interposição de nenhuma instituição eclesiástica intermediária brasileira. Conforme o Decreto nº 7.107, de 11-2-2010, que regula o Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, "a Santa Sé é a suprema autoridade da Igreja Católica, regida pelo Direito Canônico". E a CNBB é apenas um ente burocrático, um órgão de apoio, uma instituição eclesiástica sem nenhum poder de mando sobre os bispos.
     Mesmo estando a declaração de D. Bergonzini de acordo com a realidade do plano jurídico civil e eclesiástico, soou como se fosse uma afirmação surpreendente e inédita, como uma afronta ao que supostamente seria a chefia da Igreja Católica no Brasil. Até aqui nenhum dos integrantes ousara questionar tão abertamente as orientações do órgão colegial episcopal, que se valeu durante décadas de uma autoridade fictícia, de uma enorme capacidade de pressão sobre a maioria dos bispos, e de uma eficiente transmissão ao público brasileiro de uma imagem equivocada e supervalorizada. Vamos aos fatos.
     D. Bergonzini escreveu o artigo "Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus (Mc 12,17)" que foi publicado na Folha Diocesanade Guarulhos do mês de julho/2010 e no site da CNBB. O mesmo foi depois censurado e retirado do site da CNBB. Nele D. Bergonzini afirmou que é dever da Igreja intervir no cenário político-eleitoral convidando os fiéis a não votar em partido ou candidato que desrespeite a vida (aborto) e os valores familiares.[1]
     E apontou o Partido dos Trabalhadores (PT) — que apoiou o péssimo 3º Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) e puniu os deputados petistas Luiz Bassuma e Henrique Afonso por serem defensores da vida — como sendo um partido que se posicionou de modo público e notório contra os valores da vida e da família.[2]
     Por fim, D. Bergonzini ainda citou expressamente a candidata presidencial Dilma Roussef, do PT, recomendando que os católicos não apoiem sua candidatura nem a dos demais que proponham a liberação ou legalização do aborto.[3]
     Dilma Rousseff, ao saber da declaração do bispo, comentou que aquela não era a posição de neutralidade na campanha política que a CNBB recomendara aos bispos. Tanto Dilma quanto o presidente Lula da Silva entendem que o aborto deve ser tratado como uma questão de "saúde pública", modo ladino de esquivar a grave questão religiosa do assassinato dos nascituros: a clara afronta ao 5º mandamento da Lei de Deus — “Não matarás”.
     Mesmo depois de ter desafiado a CNBB e a candidatura Dilma, D. Bergonzini não se deixou dobrar pelas inevitáveis pressões e permaneceu irredutível. Em entrevista concedida ao jornal Folha de São Paulo, ao ser questionado sobre o contraste entre a recomendação da CNBB de adotar a neutralidade na campanha, e o seu pronunciamento contrário à candidata Dilma Rousseff, o bispo respondeu: "Em primeiro lugar, que recomendação é essa? A CNBB não tem autoridade nenhuma sobre os bispos. Eu segui a voz da minha consciência. Sou cristão de verdade e defendo o mandamento 'não matarás'. Não tem esse negócio de 'meio termo'."
     E sem manifestar temor por algum tipo de retaliação ou reação negativa da parte da CNBB ou de partidários da candidata Dilma, D. Bergonzini insistiu: "Eu não vou arredar o pé, não importa as consequências que eu venha sofrer, mas o que importa é minha consciência e seguir o Evangelho. Eu não tenho medo. O que pode acontecer? Deus saberá. [...] Como cidadão, tenho direito de expressar minha opinião e, como bispo, tenho a obrigação de orientar os fiéis."[4]
     É oportuno recordar que no caso recente da menina de Alagoinha (PE), que foi estuprada pelo padrasto e engravidou de gêmeos, o então arcebispo de Recife, Dom José Cardoso Sobrinho, em defesa da cultura da vida anunciou publicamente que o Código Canônico previa a pena de excomunhão automática para todos os envolvidos. A CNBB encarregou-se de demolir o posicionamento dele. Por meio de seu secretário-geral, bispo Dom Dimas Lara Barbosa, desautorizou o anúncio da excomunhão. A CNBB atuou como se fosse a chefia da Igreja Católica no Brasil. Mesmo desacreditado, D. José Sobrinho não recuou. E venceu. Pois cumpriu o seu dever e combateu o bom combate. Também a intrepidez de D. Bergonzini ficou insculpida na história eclesiástica brasileira.
     O poder psicológico de pressão exercido pela cúpula da CNBB e suas 17 Regionais sobre o episcopado tem sido acachapante. Mas já se viu que a pedra se transforma em gelatina e surgem fendas na muralha quando a verdade católica é afirmada com ousadia e sem respeito humano.
     É alentadora a defesa postada no site da Diocese de Guarulhos, intitulada Vivas a Dom Luiz Gonzaga Bergonzini, assinada pelo advogado João Carlos Biagini, na qualidade de membro do Departamento Jurídico da Mitra Diocesana. A licitude da ação pastoral em defesa da vida promovida por D. Bergonzini e, em consequência, de sua resistência à CNBB, transparecem nas palavras do referido jurista. Inclusive o bispo agiu segundo a lei da esfera civil, como jornalista e responsável pela Folha Diocesana, de acordo com o Código de Ética, e pautou seus escritos pela verdade. Como cidadão brasileiro, fez uso do direito de manifestação de opinião consagrado no art. 5º., inciso IV, da Constituição Federal em vigor.
     Ademais, D. Luiz Gonzaga Bergonzini agiu como verdadeiro bispo católico em consonância com as regras do Código Canônico, conforme as palavras do defensor jurídico da Mitra de Guarulhos, que apresentamos a seguir, como conclusão destas considerações:
     "Dom Luiz Gonzaga expediu uma orientação, a todos os católicos, para não votarem em partido e candidatos que são a favor do aborto. Dom Luiz, como pregador do evangelho de Cristo, não poderia se omitir, ou relativizar, contrariando a Doutrina Cristã e desobedecendo ao Papa Bento XVI. Não podemos imaginar nem admitir um bispo, um padre ou qualquer religioso católico apoiando partidos e candidatos favoráveis ao aborto. Se assim agissem, eles estariam negando o seu sacerdócio e a sua fé. Então, sob o ponto de vista pastoral, Dom Luiz cumpriu sua obrigação e orientou os fiéis para não votarem em quem ofende a Doutrina Cristã. No âmbito do Direito Canônico, Dom Luiz Gonzaga deu cumprimento ao cânon 386, §1 e §2, assim escritos: “§1. O Bispo diocesano é obrigado a propor e explicar aos fiéis as verdades que se devem crer e aplicar aos costumes...” §2. Defenda com firmeza a integridade e unidade da fé, empregando os meios que parecerem mais adequados...”. Temos, então, que o Direito Canônico autoriza o Bispo Dom Luiz Gonzaga a explicar as verdades e defender a integridade e unidade da fé. Dom Luiz cumpriu sua obrigação canônica."[5]
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     NOTAS:
    [1] Disse D. Bergonzini: "[...] a Igreja não se posiciona nem faz campanha a favor de nenhum partido ou candidato, mas faz parte da sua missão zelar para que o que é de “Deus” não seja manipulado ou usurpado por “César” e vice-versa. Quando acontece essa usurpação ou manipulação, é dever da Igreja intervir convidando a não votar em partido ou candidato que torne perigosa a liberdade religiosa e de consciência ou desrespeito à vida humana e aos valores da família, pois tudo isso é de Deus e não de César." (Cf. artigo Dai a César o que é de César e a Deus o que é de Deus (Mc 12,17).) 
    [2] Afirmou D. Bergonzini no artigo supra citado: "Na atual conjuntura política o Partido dos Trabalhadores (PT) através de seu IIIº e IVº Congressos Nacionais (2007 e 2010 respectivamente), ratificando o 3º Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH3) através da punição dos deputados Luiz Bassuma e Henrique Afonso, por serem defensores da vida, se posicionou pública e abertamente a favor da legalização do aborto, contra os valores da família e contra a liberdade de consciência."
    [3] "Isto posto, recomendamos a todos verdadeiros cristãos e verdadeiros católicos a que não dêem seu voto à Senhora Dilma Rousseff e demais candidatos que aprovam tais “liberações”, independentemente do partido a que pertençam." (Idem, ibidem)  
    [4] Eis os principais trechos da entrevista concedida pelo bispo:
     Folha — Mesmo com a recomendação da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) pela neutralidade na campanha, o senhor decidiu explicitar sua posição contrária à candidata Dilma Rousseff. Por quê?

     D. Luiz Gonzaga Bergonzini — Em primeiro ligar, que recomendação é essa? A CNBB não tem autoridade nenhuma sobre os bispos. Eu segui a voz da minha consciência. Sou cristão de verdade e defendo o mandamento “não matarás”. Não tem esse negócio de “meio termo”.

     Folha — A candidata afirma que não defende a descriminalização do aborto. Mesmo assim, o senhor cita o nome dela no artigo.

     D. Luiz Gonzaga Bergonzini — Ela [Dilma] segue o partido, ela é a candidata. Então eu vou matar a cobra na cabeça. Pessoalmente não tenho nada contra ela. Mas o direito à vida é o maior direito humano. O aborto é atitude covarde e criminosa. Eu não arredo o pé, não.

     Folha — Como o senhor concluiu que ela tem essa posição? Isso nunca ficou claro e ela nega.

     D. Luiz Gonzaga Bergonzini — É o terceiro plano de governo que ela adota. Como percebeu que havia reação, foi mudando. Não vou recuar.

     Folha — O senhor pretende levar ao conhecimento dos fiéis da diocese essa recomendação de não votar na candidata Dilma?

     D. Luiz Gonzaga Bergonzini — Os padres devem notificar ao povo a orientação do bispo. Eu não vou arredar o pé, não importa as consequências que eu venha sofrer, mas o que importa é minha consciência e seguir o Evangelho. Eu não tenho medo. O que pode acontecer? Deus saberá.

     Folha — Inclusive nas missas, os padres vão tratar do tema? Vão citar o nome da candidata?

     D. Luiz Gonzaga Bergonzini — Tratar do tema, não. Podem citar o nome dela, porque vou mandar uma carta para os padres notificarem as pessoas da minha recomendação nas missas. Como cidadão, tenho direito de expressar minha opinião e, como bispo, tenho a obrigação de orientar os fiéis.

     Folha — O senhor teme algum tipo de retaliação ou reação negativa, seja por parte da CNBB ou de partidários da candidata Dilma?

     D. Luiz Gonzaga Bergonzini — Sempre tem alguma coisa. Tenho recebido muitos e-mails. Não sei se são ameaças, mas contestando. Mas posso te dizer que muitos de apoio. As pessoas dizem: “finalmente alguém que usa calça comprida resolveu reagir”. (Cf. 
Bispo de Guarulhos diz que não recuará em mobilização contra Dilma. FSP 23/07/2010) 
    [5] Cf. o artigo Vivas a Dom Luiz Gonzaga Bergonzini, 03-08-2010, por João Carlos Biagini, advogado, Membro do Departamento Jurídico da Mitra Diocesana, postado no site da Diocese de Guarulhos.
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