Introdução;
Filhos de criação; Adoção à brasileira; Adoção segundo o Estatuto; Convivência humana e direito; Nuncupo; Um
fato; Adoção nuncupativa.
Introdução
“Se alguém dá
seu nome a uma criança e a cria como filho, este adotado não poderá mais ser
reclamado” diz o art. 185 do Código de
Hamurabi, pelo que se conclui que adoção
é um instituto cuja cogitação legal dista
de milênios. Sempre haverá quem precise
de uma família por ter perdido a própria ou dela tiver-se por qualquer circunstância
afastado.
Adoção,
do latim “ad” = para +
“optio” = opção, conota a idéia de uma opção
deliberada.
Em direito, sempre foi entendida pelo ato de
perfilhar alguém ou assumir na condição
de filho, fazendo gerar aquelas relações previstas para a família biológica,
inclusive a de impedimento para o
matrimônio entre adotante e adotado.
No Código Civil Brasileiro, sem cogitar-se de condição, nem termo tem como forma a escritura pública
perante o tabelião competente. Ali, a rigidez da norma é mais restritiva a
possibilidade de adotar. Estabelece que “só os maiores de 30 (trinta)
anos podem adotar; que o adotante há de ser, pelo menos, 16 (dezesseis) anos
mais velho que o adotado; para que sejam dois os adotantes têm que ser casados
há mais de cinco anos”.
Seguem-se
ainda, outras exigências minoradas pelo advento do Estatuo da Criança e do
Adolescente, com ampliação das possibilidades. Claro que faz exigências
fundamentais, mas visando, sobretudo a
finalidade social a qual o ato se destina, preocupa-se fundamentalmente ou
principalmente com a colocação da criança em uma família-substituta, convencido
de que os direitos irrenunciáveis que a ela assistem, até por se constituir em prioridade absoluta, navegam no seio de uma família.
Entre
o que melhor apresenta de relevante está o de que a família que substitui a
natural seja preservada de eventuais riscos,
inclusive com o cancelamento do registro original de nascimento que se transforma em legalmente inexistente.
Depois
de superar o código civil em seus termos,
o estatuto o substituiu, de modo
que, segundo sua letra é que se dá adoção, seja nacional e até internacional,
esta agora também, em estrita observância com o que dita Convenção de Haia a respeito.
Filhos de criação
No tempo dos nossos avós (expressão
que neste sentido, as gerações dos últimos anos não usarão) as casas se enchiam
de filhos de outros pais e era com respeito e até verdadeiro orgulho que se
ouvia dizer deles: tiveram 15 filhos
e criaram 12...
Eram os filhos de criação, as vezes, sejamos honestos, destinados aos trabalhos domésticos
exclusivamente, ainda que freqüentassem escola.
Não eram pessoa da família, raramente, algum se sentava à mesa de
refeição da família e nunca se
arrogaram, sabiam que não tinham, direitos sucessórios. Se na maioridade não batessem asas, saiam
casados, ou permaneciam ali, mudando só de casa. Quantos passaram a servir as
famílias dos filhos, às vezes dos netos dos seus “pais de criação”.
Constituíram-se assim, em pessoas muito queridas. Alguns sumiram de
vista, mas outros nunca esqueceram seus benfeitores e sempre houve quem “um
belo dia”, voltava para uma visita.
Adoção à brasileira
Mais rara nos últimos tempos, foi com muita naturalidade,
freqüentíssima em outros e teve sempre como razão propulsora um sentimento
humanitário e de bondade. Passava a largo da lei. Traduzia-se no ato de muitos
que “apanharam” em hospitais ou em outro lugar, ou receberam das próprias mães sob alegação de
falta de condições para criá-las,
crianças recém-nascidas ou não, registraram como se fossem seus
filhos e nunca se ouviu dizer que em
qualquer tempo, pudessem ter sido questionadas pelos adotados ou por quem quer
que seja.
Recebeu o título de adoção à brasileira.
Adoção segundo o Estatuto
Com
as mudanças que se processaram, a ação dos meios de comunicação social, outros
fatores, como as chamadas facilidades da vida moderna, principalmente, além da
ação decisiva da Igreja com a sua opção preferencial pelos pobres, tornou-se
claro o conhecimento de que adoção se faz, através de requerimento judicial.
É
decisiva a divulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente nos seus diversos
aspectos e a grande maioria sabe que segundo os termos
dessa lei é que se procede à uma adoção.
De
fato, o estatuto inovou com a chamada colocação em família substituta, de três
modos ou mediante tutela, guarda ou adoção.
Quem quiser
adotar terá que comprovar sua efetiva disposição, tanto quanto a capacidade
física, social, psíquica e econômica.
Uma equipe inter disciplinar entra em ação e só mediante o resultado das
diversas diligências que procede
finalizando com um relatório é que virá
o juízo do ministério público e finalmente o deferimento mediante sentença que
uma vez passada em julgado torna a adoção irreversível.
Convivência humana e direito
Tudo
em direito é dinâmico. A convivência humana, ao longo dos tempos, vem-se
encarregando de criar situações as mais diferenciadas, com origem em inúmeras
circunstâncias. Mantém em estado de repouso as pessoas envolvidas,
principalmente seus ânimos. E, geralmente, tem sido debitado à questões
patrimoniais ou econômicas o ônus de ser
ponto de partida das desavenças que venham a surgir, ou seja,
nelas é que se criam
desagradáveis “zonas-de-conflito”.
Quando
os ditames da boa convivência não se revelarem suficientes, quando forem
esquecidos tantos momentos bons anteriormente vividos, quando o clima de
família tantas vezes respirado em comum, asfixiar, impõe-se a necessidade de invocar a tutela
jurisdicional do estado.
Daí
a necessidade de que o juiz de direito
se revele capaz de ver além das aparências, de buscar a solução nas entrelinhas da lei se necessário, na analogia e nos costumes. Principalmente,
estar atento ao que recomenda o art. 5º da Lei de introdução ao código
civil: “Na aplicação da lei, o juiz
atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”,
pois sua resposta deve ter em conta o grito pela melhor justiça.
Nuncupo
Nuncupo significa
proclamar, pronunciar-se solenemente, declarar, adotio nuncupata, adoção
solenemente proclamada, afirmar solenemente que os posteres receberiam o
espólio. (Dizionario della
lingua latina – Socuta Editrice Internazionale – Torino – 1946).
Nuncupativo
vem do verbo “nuncupare” – chamar, nomear, declarar. (Dicionário latino, Ed.
Saraiva). No Direito Romano, se chamava nuncupatum testamentum o
testamento apenas de boca.
O Código Civil Brasileiro adotou a idéia, mas uma única vez como advérbio, usa o termo:
“As pessoas designadas no art. 1.660, estando empenhadas em combate, ou
feridas, podem testar nuncupativamente, confiando a sua última vontade a
duas testemunhas”. (art 1.663)
Com guerras,
na acepção do termo, não convivemos, mas com convivência duradoura entre homem
e mulher em nossa sociedade, sim. Por isto, o quinto melhor código civil do
mundo, que é o nosso, preveniu a possibilidade de procederem à celebração do
casamento. “Em caso de iminente risco de
vida (in articulo mortis), as partes podem chamar, pedir o comparecimento da
autoridade ou de seu substituto para celebrar-lhes o casamento na presença de
seis testemunhas. (inc. II,
art. 199).
A este, por
analogia, com o testamento
nuncupativo (testamento de boca), se denominou casamento nuncupativo.
Um fato
De um jurista iniciante, do interior
mineiro, via e-mail, nos chegou a seguinte colocação: “há cerca de quarenta
anos, uma senhora casada, sem filhos, “apanhou” na maternidade da cidade, uma
criança do sexo masculino e levou para casa. O marido não a quis assumir em
qualquer termo. Um fazendeiro vizinho, solteiro, se encanta, pega o menino, leva para casa,
cria com ajuda da mulher de um dos seus
empregados. Tornou-se pai de fato. O
menino cresceu, casou-se, continuou morando com o pai, seus filhos chamavam a
este de avô e todos se referiam a ele
como filho de tal pai. O relacionamento entre eles era realmente de pai para
com o filho e de filho para com o pai.
A realidade era tão forte que nenhum
vento jamais soprou para a necessidade de que a consolidação daquela realidade
requeresse algo mais.
Com a morte do fazendeiro, sem
ascendentes, os colaterais buscaram a herança.
À
alegação que fizeram de que o rapaz não era filho, foi contraposta com uma
escritura pública de aquisição de uma área de terra, quando o mesmo ainda era
“menor impúbere” da qual consta que
“neste ato, Fulano de Tal é representado por seu pai, Beltrano de Tal”.
Corria o
tempo em que a forma exclusiva de adotar era escritura, quando não se
exigia “condição, nem termo” exatamente como previsto no art. 375 - A adoção far-se-á
por escritura pública, em que se não admite condição, nem termo. (CC)
Perguntou-nos
aquele colega: - Este rapaz tem direito à herança do fazendeiro?
No mesmo momento, procedendo à
analogia, respondemos: sim. Trata-se
de uma adoção nuncupativa.
As
mutações no direito vêm continuamente cedendo às fortes pressões das mudanças
pelas quais passam a sociedade, pois, deve ser sensível às situações peculiares
que a convivência humana recomenda, chegando mesmo a impor, sob pena de assumir
a responsabilidade pela ausência de paz
que puder causar no ânimo de alguém.
Durante
muitos anos, hostilizaram-se pessoas vivendo em concubinato, chegavam a ser
olhadas transversalmente. Novos horizontes trouxeram-nas ao convívio aceitável.
Veio a lhes ser reconhecido, no caso da mulher especificamente, indenização
pelos serviços que prestou enquanto convivente, ao se separar. Nem se olvide
que a jurisprudência dos tribunais, mediante reiteradas decisões contribuiu
decisivamente para o advento do que veio a prever a Constituição Federal de 88:
“para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem
e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em
casamento”. (§ 3º art. 226).
Por extensão, todas as ações que versam sobre tal união são
tratadas em varas de família.
Tais
pressupostos especificamente, arrimam nossa convicção de que aquela é, com
todas as letras, caso de uma adoção nuncupativa.
Se bem
atentarmos, como dito inicialmente, repetindo, vamos convir. “Nuncupare
significa proclamar, pronunciar-se solenemente, declarar, adotio nuncupata,
adoção solenemente proclamada, afirmar solenemente que os posteres receberiam o
espólio”. Já tendo sido pacificado que
na mencionada circunstância se dá um casamento nuncupativo, nada falta ao caso
enfocado para ser uma adoção nuncupativa.
Com muito
mais razão que ao casamento, onde os cônjuges são meeiros, adotio nuncupata se refere a filho e quem é filho, herdeiro é.
Como tudo
que é novo vai provocar acirradíssimos embates. A irresignação dos
vencidos não se furtará a percorrer
todos os caminhos que ainda estejam abertos, a cada decisão que os
desfavorecer.
Uma coisa
é certa, se pelas características e pela semelhança com a prestação da
reverência recíproca devida e cumprimento dos deveres de respeito e fidelidade
mútua erigiram a união estável à condição de entidade familiar, será sua
correspondente na relação entre pais e filhos a reconhecer entre estes o
vínculo parental.
Adota nuncupativamente quem no exercício pleno de sua capacidade de
decidir, mediante qualquer forma, declara ser pai de uma criança socialmente
reconhecida como seu filho.