domingo, 13 de janeiro de 2019

MARIA VISITA ISABEL

Da cepa brotou a rama,
Da rama brotou a flor,
Da flor nasceu Maria,
De Maria, o Salvador.



Baseado em Lucas, 1,16 ss.

Na liturgia da Palavra do domingo, 23 de dezembro de 2018, a passagem narrada pelo Evangelho como antes nunca, me tocou profundamente.  E sou levada a fazer o que agora faço, escrevo,  mas é a conclusão à qual cheguei e revelarei no final, que se constituiu no objetivo, na associação que fiz entre aquele e os outros momentos que poderiam estar acontecendo em vista das causas ou situações que cotidianamente, vivenciamos.  

Embora sempre implorassem juntos ao Senhor o advento de um filho, penso que de certa forma entendiam, que o tempo de Deus não é o nosso, sabiam que os pensamentos de Deus não são os nossos. Os planos de Deus estavam bem traçados, o filho que gerassem, seria precursor do Messias cuja chegada era estimada para a “plenitude dos tempos” o qual ainda não chegara. A pobre Isabel provavelmente terá provado uma certa humilhação perante o marido, personagem de destaque, fazia parte da equipe dos sacerdotes de Abias.

Competia a eles oferecerem os sacrifícios e holocaustos a Javé, únicos autorizados a entrar no “santo dos santos”. O povo permanecia na área externa do templo. Era assim o rito litúrgico à época. Mas o que me faz refletir melhor, no entanto, foi pensar o quanto era feliz a Virgem Maria, “bendita entre todas as mulheres ... porque acreditou nas coisas que da parte do Senhor lhe foram ditas”,  que, ao invés de se orgulhar por ter sido escolhida pessoalmente por Deus para protagonizar o  fato mais importante, eficaz e duradouro pelos séculos e séculos sem fim, “conceber do Espírito Santo e dar a luz, o Filho de Deus que se fazia homem, para salvar a todos”. Considerou como pura misericórdia o ato de “o Senhor olhar para a humildade de sua serva”. E a salvação compreendia a geração que já passara, da que vivia, e as futuras, hoje, e os que ainda estão por vir.
Anunciação

Tudo se deu enquanto no silêncio – diz-se que foi encontrada ajoelhada - se entregara a oração. Absorta na contemplação dos mistérios abissais de Deus, tem sua atenção desviada para improvisa aparição de um Arcanjo que se apresentou como emissário do senhor para revelar-lhe uma missão a cumprir e para tanto, obter seu consentimento livre, no uso da  liberdade da qual o mesmo Deus dotou todos os filhos seus.

A saudação tinha caráter absolutamente insólito e ao mesmo tempo      exclusivamente usada em relação a ela, não pelo interjetivo. “salve”,  mas pelo que foi acrescentado a seguir: “cheia de graça”.

Ave! Salve! Olá! Shalon! Tudo bem? Como vai? Nada disto, mas “cheia de graça”. Realidade extraordinária e que além do mais só a ela foi  dirigida por ordem e desígnio do que governa terras, mares e céus.

Mas é natural que quisesse um esclarecimento: “como se dará isto”? O Arcanjo lhe responde: “o santo que nascer de ti, será chamado Filho de Deus”. E nada mais se fez necessário para que generosamente respondesse em promessa que jamais seria descumprida: “eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim, segundo a Sua Palavra”.

Foi desde sua conceição, imaculada, o pecado que “emporcalha” todos os descendentes de Adão e que só pela força do batismo é apagado, não penetrou nela, não a atingiu e quando de Anna e Joaquim foi concebida esta nova vida, cumprido o tempo da gestação, num oito de dezembro, nasceu um serzinho que se chamaria, simplesmente Maria. Seus pais ainda que virtuosos, não tinham olhos capazes de vê-la além da aparência, era igual à, de todo ser humano; ou que, olhando-a divisassem naquela menina alguma diferença ou distinção  de outras, suas coetâneas. 

Mas ao vê-la desenvolver-se, pelos seus gestos, pelo modo com que se expressava o que só se justifica pelo seu ser “cheio de graça,” acabaram por compreender sem que sequer imaginassem o que fosse, que algo de especial havia naquela sua Maria.

Pais verdadeiros em família exemplar estavam sempre atentos, sempre vigilantes em tudo que lhe dissesse respeito. E tão compenetrados da realidade, costumes vigentes naqueles tempos, ainda que fosse tão jovenzinha, não consta que se tivessem oposto ao seu casamento com um homem bem mais velho que ela. De virtudes reconhecidas, mas mais velho e mesmo reunindo as qualidades do que lhe deu o título de “homem justo”, e claro, principalmente, por também ele, ter sido predestinado à missão de Pai putativo do Filho de Deus encarnado. Protagonizavam os acontecimentos, mas era Deus a determinar tempo e hora do que quer que fosse que podia acontecer, sem que disso se rendessem conta, de como se deviam comportar. 

E aconteceu o “arranjo” para as núpcias entre os dois. Mesmo que o período fosse de noivado, fala-se que estavam desposados (uso a expressão para fidelizar a nomenclatura da época) como constam das escrituras.

Imensurável “o silêncio de Maria”. E surgiu um complicador em seguida. Foi promovida a Anunciação, enquanto a fase da vida entre os dois era, como sobredito, o de noivado. E apesar de não lhe passarem despercebidos os sentimentos que perpassavam a reação de José, ainda assim: “conservou no coração as coisas que da parte do Senhor lhe revelara o arcanjo” Não se tratava de algo comum, mas da gestação do verdadeiro Deus, Aquele que ela carregava em seu ventre era Deus feito homem.

Dai foi, como é comum, o surgimento das interrogações. Não podia esconder que estava grávida, “mas como?  de quem”? Não se lê a aflição pela qual certamente passaram seus pais, por não ter condição de negar a verdade que a ninguém passava despercebida e no meio do povo, aquelas “conversinhas fiadas e maldosas”: quem diria hem? Eta santinha do “pau pioco”...[1]  

E o homem justo também foi sufocado pelas indagações, atônito, toma uma decisão extrema, saiu da cidadela em segredo, não tira satisfação, não comenta, não reprova. E começa sua cansativa caminhada, “abandonando-a em segredo”. A certa altura, rendendo-se ao cansaço, se acomoda em algum lugar como pode e dorme. É quando mais uma vez entra no desenrolar dos fatos um Anjo o qual lhe diz: Vai embora não, José, Maria é uma moça honesta, irreprovável, ou mais precisamente, “bendita entre todas as mulheres, receba-a como sua esposa,  pois tudo que aconteceu com ela, foi por obra e graça do Espírito Santo”. Não consta que José tenha proferido a voz, mas com ação imediata, pronuncia seu SIM a Deus e que por  sua vez, não retiraria jamais. Empreende o caminho de volta e esteve sempre ao lado dela, fazendo seu papel de “pai de família” .

Maria enconrta Isabel
Voltando ao que sucedeu no encontro das duas primas destaca-se o fato de que ante a proximidade daquele que precederia e com expressa missão para tanto, confessou-o Isabel, porque foi ela a sentir. Saúda Maria: Javé, meu Deus, o que está acontecendo, que merecimento tenho eu para receber na minha casa, a Mãe do meu Senhor? E disso  não tenho a menor dúvida porque apenas ouvida a voz de sua saudação “o menino exultou de alegria no meu ventre”.

E revelando que não era nenhuma bobinha e que nos seus silêncios sempre meditou sobre as escrituras, Maria entoa o canto que a personificou, tornou-se o currículo de sua vida. A primeira palavra é de gratidão, a segunda de louvor: “minha alma agradece o Senhor, explode de alegria a minha alma em Deus, meu Salvador”.

E tiveram três meses para compartilhar suas vidas, orarem juntas, agradecerem e louvarem os prodígios operados por Deus em suas vidas. E João nasceu.

A conclusão?

E qual foi minha conclusão, e que, eu sei,  não chega a ser novidade? Assim me expresso porque foi como fui dominada durante a reflexão: Deus é absolutamente o Senhor, razão porque “toda língua deve confessar isto, para a glória de Deus Pai”. (Fil. 2,11). Sendo Senhor, é Ele que determina cada momento de nossas vidas, como já dissera Jeremias 1,5: “antes que te formasse no seio de tua mãe, te conheci, antes que dele saísse, te santifiquei e te entreguei para seres profeta das nações”. Não dá para se ter a menor dúvida de que somos absolutamente conduzidos por ele, sempre que escolhemos  a estrada santa, aquela que nem mesmo os loucos ao trilharem-na,  correm o risco de errar. (Is. 35,8).

Nada disso se aplica aos que optam pela prática do mal, por matar centenas e até mais de pessoas inocentes, por atos de terrorismo, pelos ditadores biliardários deixando o povo à míngua, pelo poder e não fazer, pela indiferença frente aos males que acontecem.  “É onde há amor e caridade é ai que Deus está”.

Ele projeta o curso dos nossos dias, tudo que devemos fazer, colocando à nossa disposição as graças para que executemos o melhor dos melhores possíveis, tudo devidamente cronometrado. E ainda mais,  para redimir-nos do pecado permitiu que seu Filho humilhando-se se entregasse à morte na cruz.

E nunca me esqueço do exemplo dado pelo saudoso Pe. Carlos Furbetta, dos Missionários Combonianos, numa aula de religião. “Estamos completamente em Deus. O peixe, por exemplo, vive na água, mas no lugar onde o peixe está, a água não está, mas Deus está dentro de nós, mesmo onde nosso corpo está, Ele está”. Ele sabe tudo a nosso respeito, tudo que tem para nós é concedido no Seu tempo, na Sua hora, como e onde Ele quer.

Se Ele assegurou: “batei e abrir-se vos há” (Mt. 8) ... quando chegar o tempo...
Quer saber mais, confira com o Salmo 138, de Davi.

Marlusse Pestana Daher                                                                               Vitoria, 12 de janeiro de 2019 23:47         




[1] Pau pioco: expressão popular e pejorativa, diria que equivale a túmulo caiado.