quarta-feira, 30 de novembro de 2011

TEMPO DE ESPERA

O advento ou tempo de espera – precede o natal - se caracteriza por uma dimensão fundamental de espera. Quando nos colocamos numa atitude de quem espera que algo aconteça é porque ainda não temos, assim, a realização da esperança é a alegria de recebermos o que esperávamos.
CIDADE SOL
Não nos colocamos só em uma atitude de espera, mas reunimos sempre o que há de melhor em nós, concentramos ali nossas energias, organizamos nosso tempo para esse encontro, chegamos a sonhar com ele. Isto é advento.
E Natal é celebração do nascimento de Deus que se faz homem, mediante um nascimento humilde, sem estardalhaço, sem pompa, sem rendas, simplesmente uma criança. Nem poderia ser diferente, pois Jesus quis ser como nós e estar o mais perto de nós,  manifestando-se de forma a mais concreta ao mesmo tempo, a mais sublime.
É diferente do presépio onde percebemos a força da fragilidade de Deus, pondo-se totalmente à nossa disposição, convidando-nos ao acolhimento e ao serviço.
Podemos acolher essa continua novidade de Deus que se renova a cada Natal, de acordo com a nossa situação concreta, porque cada ano acontecem coisas diferentes e Deus entra na minha na sua história, com uma nova promessa, com alegria diferente.
A grande pergunta é onde quero que Deus esteja na minha vida? aqui e agora?

terça-feira, 29 de novembro de 2011

ADVENTO

Advento é preparação para a chegada de Jesus à terra. Volta para nos lembrar que seu amor não tem limite, é amor que só sabe amar, amor único.
Meu filho e meu Deus!
No mais íntimo de nós, nosso coração percebe que acontecem manifestações produzidas por uma expectativa de algo bem maior do que as que nos invadem, revestidas de luzes e cores, atraem nossa atenção, acrescidas de boa música nos enlevam e acabam por nos surpreender repetindo os mesmos acordes, enquanto se faz prepotente a ânsia de adquirir tais mimos, habilmente  dispostos nas vitrines e daí se conta somente um passo, adquirir o que não estamos precisando.
E nos enchemos de pacotes, gastamos o que não temos, comprometendo nosso salário e até nos endividando, e o que é pior a isso chamamos de natal. Somos enganados, ou melhor dizendo: deixamo-nos enganar.
Aquilo de que sentimos falta e que nos provoca ânsias não se preenche com coisas, bebidas ou comidas adquiridas com dinheiro. Nossa ânsia, o desejo mais profundo que inquieta nossa alma é o amor de Deus semeado pela fé em nós, pela graça, de graça, temos sede é de Deus.
Temos sede do Amor-Deus porque Deus é amor. O que queremos  na verdade é acolher aquele menino que nasceu do lado de fora porque as casas todas estavam muito cheias.
Abramos nosso coração à graça. Deixemos de fora as coisas que o dinheiro proporciona. Assim esvaziados, Jesus vai ter espaço para nascer em nós.

sábado, 26 de novembro de 2011

DOLORES SIERRA

       Quantas vezes terei cantado, claro, imitando a postura da voz de Nelson Gonçalves, “Dolores Sierra”, aquela, que “vive em Barcelona, na beira do cais”.
Não tinha castanholas e sua companhia era a de quem desse mais. Nascida em Salamanca, de um pai lavrador, chegada à maior idade, parte para o mundo. Passara toda a adolescência nas asas da imaginação, em sonhos fantásticos mil, entre eles, mudar para a cidade grande.
Não obstante o pranto copioso da mãe, sua fantasia forjada longamente, foi capaz de superar tudo. E, mesmo depois das lágrimas abundantes que também seus olhos versaram, afinal de contas, amava muito os seus, partiu.
Praticamente, no mesmo dia de sua vida catalunha, conheceu D. Pedrito. Tinha que ser um Pedro, cujo nome se associa sempre a quem é muito levado e “apronta todas”!
Pois bem, encantado com tamanha e angelical pureza, tomado da cobiça e da vaidade de “ser o primeiro”, aproxima-se, seduze-a, nada menos, e lhe faz promessas inúmeras nos dias que passaram a viver  juntos numa pensão nas imediações do hoje “Porto Velho” de Barcelona. Mas está tão bem cuidado, tão limpo e majestoso, que de velho só resta o nome.
As promessas? Faria de Dolores rainha, cobri-la-ia de seda do Líbano, de aromas de França, sapatos macios e na mesa nunca faltariam as melhores iguarias. Imagine-se todo esplendor por onde quer que estivessem ou passassem!
Na casa onde viveriam... de amor, contaria com serviçais altamente qualificados, quem melhor pudesse prestar. Bastaria que ela permanecesse linda, produzida no melhor estilo, com hoje se diz, contando as horas da ausência dele, até que  pudesse voltar.
Num tocar de sonoras campainhas, aliás, diversas, cada som traduziria uma finalidade, todas as solicitações, todos os desejos que tivesse seriam prontamente satisfeitos.
Foram poucos aqueles dias, mas o suficiente para ter sido profundamente sugada.
Naquela manhã, um facho de luz consegue transpor as cortinas da janela e atingiu-lhe a face. Era de meio-dia a pino. Virou-se, ainda de olhos fechados, mas com um sorriso emoldurando os lábios, suas mãos procuraram o corpo do amado que ali já não estava.- Bem, terá saído...
Mas as horas passam, veio a noite e nada. Sem saber mais o que pensar, de tão cansada, acaba adormecendo...
Desperta cedo no dia seguinte e dirige-se ao restaurante para o desjejum. Ao fim, o dono da pensão a chama e comunica que suas diárias pagas findavam ali.
Apesar de nascida na roça, era dotada de inteligência bastante para entender que fora enganada. No quarto, chorou todas as lágrimas que pôde e como o meio dia se aproximava, reuniu o que era seu e ao transpor a soleira daquela porta, pisou a sarjeta, era mais um autômato que gente.
Rumou na direção que a conduziram seus passos e quando pôde perceber, viu-se no cais do porto.
Sentada num degrau de pequena escada, passou o resto da tarde e quando a noite totalmente se fez, sem nem divisar o rosto do homem que lhe estende a mão e ajuda a levantar-se, deixou-se conduzir.
Dia seguinte, primeiras horas da manhã ainda, ele a despede depondo-lhe na mão, uma peseta.
Faminta, com sede, com frio, passa a viver os dias, à beira do cais. Posto que muito bela, não lhe faltava companhia, a de  “quem desse mais”. Até quando?
Pelo que se ouve, nosso poeta também a conheceu, esteve em sua companhia, tanto que “pagou a despesa”. Mas ele também como tantos, ao apito do navio, foi-se, não sem antes dizer adeus, a Barcelona e a Dolores Sierra.
O tempo passou, o nome de Barcelona ancorou na minha memória ligado a essa história triste, em música tão agradável cantada.
Em viagem às plagas catalúnicas, me propus, tenho que conhecer o cenário da vida dessa mulher imaginária que são todas que podem contar história idêntica a sua.
E não é que após longa caminhada, primeiro por ruelas estreitas, maravilhosas, a partir da Praça da Catedral, me vi em Las Hamblas, onde acabei por chegar ao Porto Velho!
Pelo passeio central, deparei-me com um cenário de tantos ambientes, tanta variedade de nacionalidades, de demonstrações teatrais, grupos de dança, de todo tipo de criatividade que se puder imaginar.
Lá está também, resultado da comemoração dos 500 anos de descobrimento da América, um monumento com uma estátua de Cristóvão Colombo, voltada para os mares “nunca dantes navegados”. O pedestal  de tão alto, obriga inclusive quem muito alto é, para olhar, a voltar a cabeça inteiramente para trás.
Que mania, pôr tão alto quem  não se pode mais ver, nem ser visto! É por isto que faço parte dos que acham que toda ternura que se quiser demonstrar a qualquer ser humano, que se faça agora, adiar ou esquecer resulta inútil.
Estavam lá, um paço enorme que precede a chegada à beira do cais, edifícios bem cuidados, dezenas de embarcações multicoloridas, gente que caminha de lá para cá, ônibus que trafega com turistas, tudo demonstra ares de quem, recentemente, sediou edição de jogos olímpicos mundiais.
Depois de ter fotografado tudo, girando-me como em círculo, pergunto-me onde Dolores Sierra se encolhera naquele triste dia? Em que degrau sentou-se, se aqueles que ali estão só servem de passagem para quem chega a vistosas embarcações de passeios ao largo?
É que aquele já não é o cais do porto que acolheu Dolores, ela não está mais ali... Mas que minha divagação valeu, ah isto valeu e como!


Barcelona, 8 de setembro de 2006




















terça-feira, 22 de novembro de 2011

O BEM NÃO FAZ BARULHO

        Todos nos devemos manter atualizados, saber o que se passa ao nosso lado, além de nós, e até em outras fronteiras.
O meio destinado à promoção desta possibilidade é a mídia: jornais, televisão, rádios e revistas. Entretanto, já há pessoas que se recusam a ler jornais. Uma expressão comum entre muitas é a de que, “se torcermos o jornal, sai sangue”, traduz-se em dizer que as notícias estampadas em suas páginas são sempre de desastres, crimes de toda sorte, morte.
De fato, os jornais optaram preferencialmente por anunciar o mal, as coisas ruins que acontecem. Dizem que é disto que o povo gosta e se não usarem de tal expediente, o jornal não é comprado. É claro, que como empresas que são, devem dar lucro.  Daí ser este o principal objetivo deles.
Antes de escrever, examinei ao menos seis edições de um determinado jornal e a constatação não foi outra.
Entretanto, os que cremos em Deus não nos podemos incluir entre os arautos do caos. Importa crer que “Jesus Cristo é o Senhor”, (Fil. 2,11) que são muito mais os que creem nele, do que os que o renegam e que, numa “nação, cujo Deus é o Senhor”, (Sl 143,15) não obstante as aparências, devemos continuar acreditando, que nem tudo está perdido.
Podemos ter desviado o rumo de muitas coisas, muitas mesmo. Perdemos o sentido da grandeza de Deus, deixamo-nos levar por outros deuses e seguimos ao invés dos verdadeiros pastores, lobos vorazes.
Perdemos o rumo da família que “recebeu a missão divina de ser a primeira célula vital da sociedade... se torna uma espécie de santuário doméstico da Igreja, quando a piedade de seus membros os reune na oração comum, ... pratica a hospitalidade, promove a justiça e se põe a serviço dos que passam necessidade”. (Vat II 955).  Somos levados a não levar a sério a voz da consciência e, mesmo, quando sentimos os apelos que nos são feitos de forma categórica, achamos que o destinatário pode ser “um outro”.
A Palavra de Deus é ouvida, mas pouco posta em prática. Abdicamos do nosso potencial de cidadãos e não nos posicionamos de forma mais categórica ante os representantes que elegemos, que não cumprem o que prometem, e ainda assim, levados por falsos cantos de sereia, os discursos de palanque, acabamos por reconduzi-los aos cargos dos quais se valem, somente, para a própria promoção.
Marginalizamos ou não conhecemos nossos direitos, ao invés, somos capazes de criar, inexistentes.
Formamos a comunidade humana que só será bem definida, só será plena e conduzirá todos a serem efetivamente iguais perante a lei, se todos, neste sentido, se empenharem.
Nós também formamos o que na natureza se chama de ecossistema, comunidade de seres vivos que se entrosam, colaboram uns com os outros e ainda servem ao homem, por acréscimo.  Já dissera Raul Folereau: “ninguém tem o direito de ser feliz sozinho”. 
É preciso buscar o bem e saber contrapô-lo ao mal. É preciso não comprar o jornal puro sangue. É preciso proclamar pelas ruas e praças que o bem existe.
O bem é de Deus e assim é discreto, age silenciosamente, persistentemente, dá sem nada pedir em troca, é fermento que leveda a massa e a faz crescer. O mau precisa de palco e dá espetáculo para ser visto.
Não é verdade que tudo vai de mal a pior. Ou o sacrifício redentor do Cristo, Filho de Deus, de nada teria valido.
Talvez precisemos mudar as cores das lentes dos óculos através dos quais contemplamos as coisas e acabaremos por constatar que como o bem não faz barulho, o barulho não faz bem.




segunda-feira, 21 de novembro de 2011

CARINHOSAMENTE

Bafejada pelo sol que brilha maravilhoso nesta manhã de segunda-feira, saudo os que me lêem na Malásia, na Suécia, na Argentina, em Cingapura, no Reino Unido, em Cabo Verde, em Portugal, na Itália, na Alemanha, na Rússia, nos Estados Unidos, na Espanha, em Costa Rica e claro, no Brasil.

Aquele abraço

Marlusse
marlusse2010@gmail.com

domingo, 20 de novembro de 2011

SOLENIDADE DE CRISTO REI

        A ele que nos ama e nos libertou de nossos pecados com seu Sangue...a glória e o poder pelos séculos (Ap 1, 5-6). Colocada no fim do ano litúrgico, aparece a solenidade de Cristo Rei como síntese dos mistérios de Cristo comemorados no curso do ano, como o vértice em que resplandece com mais intensa luz a figura do Senhor e Salvador de todas as coisas.
Domina nas duas primeiras leituras a majestade e o poder régio de Cristo. Contempla a profecia de Daniel (7, 13-14) seu aparecimento nas "nuvens do céu" (ibidem, 13), fórmula tradicional que indica a volta gloriosa de Cristo no fim dos tempos para julgar o mundo. "Todo o poder lhe foi dado, toda a glória e império. Todos os povos, nações e línguas o servirão. Seu poder é poder eterno. Seu reino não terá fim" (ibidem, 14). Deus - "o Ancião" (ibidem, 13) - o constituiu Senhor de toda a criação, conferindo-lhe um poder que ultrapassa os confins do tempo.
Na 2ª leitura (Ap 1,5-8), realça-se este conceito com a famosa expressão: "Eu sou o Alfa e o Omega, diz o Senhor Deus, aquele que é, que era e que vem, o Onipotente" (ibidem, 8). Cristo, Verbo eterno; é "aquele que é" e sempre foi, princípio e fim de toda a criação. Cristo, Verbo encarnado, é aquele que vem para salvar os homens, princípio e fim de toda redenção e que um dia virá para julgar o mundo. Ei-lo que vem entre as nuvens e todos os olhos o verão, também os que o traspassaram e, por causa dele, hão de se lamentar todas as tribos da terra “(ibidem, 7).
A visão grandiosa de Cristo Senhor universal une-se a de Cristo crucificado e esta recorda a consideração de seu imenso amor: “Ama-nos, e nos libertou dos nossos pecados em virtude do seu Sangue" (ibidem, 5). Rei e Senhor outro caminho não escolheu, para purificar os homens do pecado, senão lavá-los com o próprio Sangue.       Unicamente por este preço os introduziu no seu Reino, onde os admitiu não só como súditos, mas também como irmãos e co-herdeiros, como co-participantes de sua realeza, de sua dominação sobre todas as coisas. Assim, com ele, único Sacerdote, poderemos oferecer e consagrar a Deus toda a criação. "Fez de nós um reino de sacerdotes para Deus, seu Pai" (ibidem, 6). Até este ponto quis Cristo Senhor que participassem os homens de suas grandezas!
O Evangelho (Jo 18,33b-37) também apresenta a realeza de Cristo em relação com sua Paixão e a contrapõe, ao mesmo tempo, às realezas terrenas. Tudo isto baseado no colóquio entre Jesus e Pilatos. Sempre se ocultara o Senhor às multidões, que em momentos de entusiasmo queriam proclamá-lo rei. Entretanto agora, que está para ser condenado à morte, confessa abertamente sua realeza. A pergunta de Pilatos: "Então és rei?", responde: "Tu o dizes, eu sou Rei" (ibidem, 37). Antes, porém, declarara: "Meu Reino não é deste mundo" (ibidem, 36).
A realeza de Cristo não está em função de domínio temporal algum, nem político! E, ao contrário, de domínio espiritual: consiste em anunciar a verdade, em conduzir os homens à suprema Verdade, libertando-os das trevas do erro e do pecado, "Para isto vim ao mundo - diz Jesus - para dar testemunho da verdade" (ibidem, 37). Jesus é a "Testemunha fiel" (2ª leitura) da verdade, isto é, do mistério de Deus e de seus desígnios de salvação do mundo. Veio revelá-los aos homens e testemunhá-los com o sacrifício da própria vida. Por isso, só quando está para abraçar a Cruz declara-se Rei. E, da Cruz, atrairá tudo a si (Jo 12,32).
Impressionante é que, no Evangelho de João - o evangelista teólogo - esteja o tema da realeza de Cristo constantemente ligado ao da Paixão. E que, na realidade, é a Cruz o trono régio de Cristo.  Da Cruz abre os braços para apertar a si todos os homens, da Cruz governa com seu amor. Para que reine sobre nós, temos de nos deixar atrair e vencer pelo seu amor.
Orações

*Deus eterno e todo-poderoso, dispusestes restaurar todas as coisas no vosso amado Filho, Rei do universo, Fazei com que todas as criaturas, libertas da escravidão do pecado, e servindo à vossa Majestade, vos glorifiquem eternamente.

Missal Romano, Coleta

*Sois Rei, Deus meu, por toda a eternidade; não é emprestado o Reino que tendes, Quando se diz no Credo: "Vosso Reino não terá fim", experimento, quase sempre, particular alegria, Dou-vos mil louvores, Senhor, e bendigo-vos para sempre; enfim, vosso Reino durará eternamente (Caminho 22,1).

Ó Jesus meu, quem pudera dar a entender a majestade com que vos mostrais e quão Senhor de todo este mundo, dos céus e de outros mil mundos e de inumeráveis mundos e céus que poderíeis criar! Claramente se vê, Jesus meu, o pouco poder de todos os demônios em comparação do vosso, Na verdade, quem vos tiver contentado plenamente pode calcar aos pés o inferno todo, Sim, quereis dar a entender quão grande é o poder de vossa sacratíssima Humanidade unida à divindade, Aqui se representa bem o que será no dia do juízo ver a majestade deste Rei e o rigor que mostrará aos maus. Aqui é a verdadeira humildade incutida na alma pela vista de sua miséria que não pode ignorar; aqui, a confusão e o verdadeiro arrependimento dos pecados, Vendo a alma que apesar de tantas infidelidades continuais a dar-lhe tantas mostras de amor, não sabe o que fazer, e assim fica aniquilada (Vida 28, 8-9).
Sta. Teresa de Jesus
Eduardo Rocha Quintella

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

OI AMADA!

De Jô para Thelma Azevedo


Thelma em almoço de fim de ano

Oi amada!” Essa era sua saudação habitual quando me ligava pedindo carona para reuniões e eventos da Academia Feminina ES de Letras.
Ao estacionar diante de seu prédio, lá estava você, no portão, toda elegante e perfumada, à minha espera. Vou sentir saudades de nossos papos nas idas e vindas pelas ruas de Vitória.
Estive em sua casa na antevéspera de sua partida, lembra-se? Encontrei-a serena e sorridente, diante do televisor. Notei que estava trêmula e também com voz trêmula, mas aparentemente bem de saúde e totalmente lúcida. Levei-lhe frutas frescas e prometi passar por lá todos os dias, após a caminhada matinal. Você manifestou o desejo de subir a serra para conhecer meu sítio. Disse-me também que seu filho tinha um sítio próximo ao meu, e que gostaria de visitá-lo antes de partir para o além.
Seu médico já havia autorizado o passeio. Combinamos fazer isso o quanto antes, talvez na próxima semana. Puxa, Thelminha! Você partiu sem me avisar!
Jo autografa para Thelma
Eu estava na roça, desconectada do mundo. Só soube de sua partida três dias depois. Desculpe-me por não estar presente em suas exéquias. Você não imagina o desapontamento, a tristeza e o vazio que me invadem ao pensar que não poderei mais vê-la, nem ouvi-la. Você demonstrava estar preparada para nos deixar, mas nós não estávamos preparados para perdê-la.
Você sempre mencionava, de alguma forma, que “sua hora” estava chegando. Eu desconversava e mudava de assunto. Nunca consegui encarar com naturalidade a perda de entes queridos. Dói muito!
Certa vez solicitaram-me um epitáfio para o túmulo de um parente. Enviei a seguinte frase: “Uma estrela que se apaga na terra, brilhará para sempre no infinito”. Pois é, querida colega, continue brilhando à nossa espera. Um dia, estaremos todos juntos, formando uma grande constelação.
Beijos para você, para os querubins, serafins e ofanins.

Jô Drumond 15/11/2011

Achei a crônica de Jô muito linda.
Não podia fazer a menos de publicar.




Obrigada Marlusse!
Até chorei ao ver meu texto com as fotos, em seu blog.
Merci chérie!
Bises


 


segunda-feira, 14 de novembro de 2011

NEM SEMPRE FICAMOS SABENDO

Dom Redovino Rizzardo, cs
Bispo de Dourados - MS
No dia 10 de outubro, a imprensa informou que Juan Pablo Pino, jogador do Al Nasr, na Arábia Saudita, foi preso por exibir uma tatuagem de cunho religioso. O incidente ocorreu quando o atleta passeava com a esposa num shopping de Riad, capital do país. Com uma camiseta sem mangas e a imagem de Jesus à mostra, acabou revoltando as pessoas que estavam no local. A confusão chamou a atenção da polícia, e o rapaz foi preso.
No dia 11, em Roma, o cardeal Leonardo Sandri demonstrou seu pesar pelo massacre de um grupo de 26 cristãos ortodoxos ocorrido no domingo anterior, no Egito: «Estes irmãos ortodoxos, depois de sofrerem o incêndio de sua igreja, quiseram expressar, como quaisquer outros cidadãos, seu desejo de liberdade religiosa e de respeito a seus direitos. Infelizmente, nesta manifestação, encontraram o cálice amargo do sacrifício e da morte. Para todos, é um fato desolador, triste e angustiante. Solidarizamo-nos com a Igreja ortodoxa e com os familiares das vítimas de uma violência sem sentido».
No dia 14, os bispos da Igreja Católica do Canadá se posicionaram sobre a condenação à morte do pastor evangélico Youssef Nadarkhani, preso no Irã por ter deixado o Islã e abraçado o Cristianismo. Em carta às autoridades políticas e judiciárias daquele país, Dom Brendan O’Brien convidou-as a respeitar a liberdade religiosa: «Pedimos que o pastor Nadarkhani, assim como todas as demais pessoas que vivem uma situação similar em seu país, sejam tratadas de acordo com o artigo 18 da Declaração Universal dos Direitos Humanos: “Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito implica a liberdade de mudar de religião ou de convicção, assim como a liberdade de manifestar a religião ou convicção, sozinho ou em comum, tanto em público como em privado, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pelos ritos”».
Por fim, no dia 28, em Perth, na Austrália, durante uma reunião dos 16 países que integram a Comunidade Britânica, foram revistas algumas das leis que regem a sucessão real no Reino Unido há 300 anos. Quem explicou a razão das mudanças foi o primeiro-ministro David Cameron: «A ideia de que o filho mais novo deva ser rei no lugar da irmã mais velha pelo simples fato de ser homem, ou de que um futuro monarca possa casar com uma pessoa de qualquer religião, menos a católica, é uma forma de pensar que está em desacordo com os países modernos que nos tornamos». Na verdade, os católicos continuam proibidos de assumir o trono inglês, pela interferência entre o governo civil e a Igreja Anglicana existente no país.
No Brasil, à primeira vista, parece que tudo seja diferente e tranquilo. De acordo com uma pesquisa realizada em 23 países pela Empresa Ipsos, ele é o terceiro país do mundo em que mais se acredita em Deus. Sobre 18.829 entrevistados, 51% creem numa entidade divina. Os que não acreditam são 18%, e os que não têm certeza, 17%.
Crer em Deus, porém, não significa que os brasileiros acolham pacificamente a doutrina pregada pelas denominações religiosas. Assim, por exemplo, somente 32% deles acreditam numa vida após a morte, enquanto 12% optam pela reencarnação.
Entre os pesquisados, um total de 18% afirmam que não acreditam em nenhum ser supremo. No topo da lista dos descrentes está a França; a Suécia vem em segundo lugar e a Bélgica em terceiro. No Brasil, de acordo com estudo publicado a 23 de agosto de 2011 pelo Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas, de 2003 a 2009, o grupo dos “sem religião” (ateus e agnósticos) passou de 5,1% para 6,7.
Em 2012, a Igreja Católica celebrará o 50º aniversário da abertura do Concílio Vaticano II. Se as religiões quiserem voltar a ocupar o lugar que lhes cabe na sociedade, não podem esquecer as palavras pronunciadas pelo Papa João XXIII no dia 11 de outubro de 1962, na abertura dos trabalhos conciliares: «A Igreja sempre se opôs aos erros, condenando-os, às vezes, com a máxima severidade. Em nossos dias, porém, ela prefere recorrer mais ao remédio da misericórdia do que ao da severidade. Ela julga satisfazer melhor às necessidades atuais mostrando a validade da fé do que condenando os erros. Ela quer ser benigna, paciente e cheia de misericórdia para com todos».

domingo, 13 de novembro de 2011

ROSA

Rosa cor de rosa, bonita e viçosa, foi colocada sobre a mesa do quarto que ia ser ocupado pela hóspede amiga que iria chegar. E a ela não passou despercebida.
Uma rosa, recém destacada de ramo que a concebera, gestara e dera a vida, tinha mesmo essa finalidade: testemunhar a pessoa, o afeto com que era recebida, e um voto: de que ali pudesse passar alguns bons dias.
Mas ainda não se completaram setenta e duas horas, ou três dias e a rosa jaz murcha, as pétalas longe estão de exibirem o viço esbanjado enquanto se abria.
É efêmera a vida das flores, tanto quanto é intensa a mensagem que deixam, inicialmente, extasiando ante o fulgor de uma vida que nasce, pelo perfume que exalam, são bem vindas, pela beleza, encantam, pelo fulgor, resplandecem.
São acolhidas e colhidas enfeitam os ambientes em que são colocadas, mas como já foi dito, por pouco tempo.
Sua efemeridade constrange as mãos que as colheram depondo em jarra para ornamento; as mesmas mãos prescindem de igual cuidado ao pegá-las de uma só vez, atentando para que não percam pétalas, sujando os ambientes e as destinam ao lixo.
Mas a contemplação dessa rosa me ensina que não é o tempo que conta ou a quantidade dos dias que se vive para viver intensamente e ser o que devemos e desejamos ser, daí importar viver cada instante, como se fosse o primeiro, o único o último.

Nas primeiras horas desse 13 de novembro os telefones soam. Do outro lado da linha voz familiar e de pronto reconhecida, colega da AFESL, diz: a notícia não é agradável:  Thelma foi para o céu.
Não resistiu aos reclamos de um coração que enfraqueceu. Thelma Maria Azevedo ocupou a cadeira nº 30 da Academia Feminina Espírito-santense de Letras que tem como Patrona Carmélia Maria de Souza.
Ainda, todo nosso carinho, nossa homenagem e até um dia.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

JÚRI POPULAR



Em Júri 1997

Com a feição mais aproximada da que conhecemos hoje, o júri originou-se na Inglaterra, no período sucessivo ao Concílio de Latrão. Remonta entretanto, ao período áureo do direito romano com os seus judices juratis. Entre os gregos era formado dos diskatas e entre os germanos pelos centeni comites.
De início, revelava forte conotação mística e religiosa, tanto que era formado de doze jurados, número que corresponde ao dos doze apóstolos, seguidores do Cristo nos seus dias da Galiléia.
Chegado a Gália, logrou ser ali rapidamente adotado, uma vez que representou a forma de na época da revolução burguesa, ser manifestado o repúdio e aversão tributada à classe dos magistrados, historicamente vinculada à nobreza e artífice de toda sorte de arbitrariedades. Foi a época das práticas irracionais dos chamados "juízos de Deus" de que os combates judiciários, a imersão em água fervente, a aplicação do ferro em brasa foram algumas das mais bárbaras demonstrações. Da França, disseminou-se por todo o continente.
Data deste tempo, o direito de dizer, por parte de um Juiz togado, se o réu devia ou não ser submetido ao crivo do julgamento popular.
No Brasil, a instituição do júri data de 18 de junho de 1822 e se encarregava do julgamento dos crimes de imprensa. Em 1824, inserido na Constituição do Império, passou a integrar o Poder Judiciário. Pelo Código de Processo Criminal de 1832 e pela reforma de 1871, foi alterado em sua estrutura e competência. Mantido na Constituição de 1891 e nas sucessivas, até 1937, quando a Carta foi omissa sobre ele, razão que a fez vir a ser corrigida por um Decreto-Lei, o de nº 167 de 5 de janeiro de 1938, o qual delimitava a soberania dos veredictos.
No capítulo dos direitos e garantias individuais, sua soberania voltou a ser assegurada, seja na Constituição de 1946, como na de 1967.
Consolidado na sua razão de ser, permaneceu, na Constituição de 1988, no título que assegura os nossos DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS - CAPÍTULO I - DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS; inciso XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
A lei que organiza o júri, na verdade um decreto-lei de nº 3.689, datado de 03 de outubro de 1941, sofreu no decurso desse tempo algumas modificações. No entanto, não no que a ele se refere. Esse decreto é o Código de Processo Penal e estabelece como competência privativa do Tribunal do Júri, o julgamento dos crimes de homicídio, simples ou qualificado, o infanticídio, o aborto; na forma consumada, isto é, com a culminação do evento morte, ou apenas tentada. Por fim, a conduta tem que ter sido praticada de forma dolosa, isto é, quando há deliberação para sua prática, com o lançar mão ou valer-se de meio idôneo, utilizá-lo e colimar o intento, ou não o colimando que tenha sido independente da vontade do agente.
Assim, quando acontece um homicídio, morte de alguém por outrem, a polícia judiciária adotará as providências preliminares. Dirigindo-se ao local, providencia análise das diversas circunstâncias e motivações do delito, identifica o autor e testemunhas que possam informar sobre o mesmo, remove o corpo para efeito de necrópsia, no Instituto Médico Legal, onde existe, na ausência deste, a médico que sob compromisso, emitirá o laudo respectivo, detalhando as lesões e atestando-as como causa da morte.
Tais diligências compõem o inquérito policial que é instaurado mediante PORTARIA de competência do Delegado de Polícia, hoje, bacharéis em direito e com preparação específica ao desempenho do mister judiciário. Quando o inquérito é concluído o Autor do delito é indiciado e os autos são remetidos ao Juiz de Direito que por sua vez, determina abertura de vista ao Promotor de Justiça o qual formando seu juízo, denuncia o autor.
Denúncia é a peça mediante a qual o Órgão do Parquet se dirige ao Estado Juiz, e depois de qualificar o indiciado de forma a tornar inequívoca sua identidade, narra a partir da hora, dia e local em que o delito tiver sido praticado, as circunstâncias em que se deu, as motivações que o rodeiam, o modo com que agiu e todos os demais detalhes, de tal forma que não pairem motivos de suposição ou dúvida, até porque, é nos termos da denúncia que se vai arrimar o contraditório. Vale para a defesa o que estiver escrito. Finalmente, aponta os dispositivos do Código Penal infringidos e requer citação do denunciado para que promova sua defesa como melhor entender; nesta oportunidade ainda, apresenta o rol de testemunhas a serem ouvidas na fase instrutora processual.
O Juiz, recebendo a denúncia, determina a citação do denunciado e seu comparecimento à sua presença para ser interrogado. Nesta oportunidade, ele toma conhecimento formal dos termos da acusação que lhe é feita, apresenta a própria versão para o fato ou de sua conduta, nomeia o Advogado que vai defendê-lo, ou se for pobre, no sentido da lei, tem conhecimento do que lhe é nomeado. É um grande momento do processo, é o momento em que pode falar, depois, estará limitado a ouvir. Tanta é sua importância que só deve ser feito de forma presencial, quando, além de através das palavras, o Juiz pode analisar o interrogando lendo no seu ânimo, deduzindo pelo como se comporta.
Em seguida, o advogado, respaldando os termos do interrogatório, não concorda ou concorda apenas em parte com a denúncia, apresenta o rol de testemunhas ou requer outras diligências. Geralmente, reserva-se o direito de só fazer conhecida sua tese, a final. Tem início o contraditório, fundamental para a validade de todos os atos. O próprio Promotor que entender pela não defesa de quem é acusado, na sua função de fiscalizar a correta aplicação da lei, deve vigiar neste sentido, ou seja, no sentido de que o contraditório seja potencialmente exercido.
São ouvidas as testemunhas arroladas pelo Ministério Público, em seguida, as que a defesa apresentou. Finda esta fase, são feitas as alegações finais pelas partes e mediante o que tiver concluído, a vista do que tiver sido provado, o Juiz proferirá uma decisão de impronúncia ou de pronúncia. No primeiro caso, decide pela absolvição do denunciado e julga improcedente a denúncia; no segundo, reconhece a presença dos elementos constitutivos do dolo, sem aprofundar-se no mérito, mesmo que paire alguma dúvida, neste caso, o in dubio é pro societate, e remete o julgamento ao Tribunal Popular do Júri.
Em certos casos, até menos, mas o tempo de tramitação de um processo está legalmente prevista, para acontecer em noventa dias.
Em toda Comarca, anualmente, são alistados cidadãos entre 21 (vinte e um) a 60 (sessenta) anos de idade, pessoas indicadas pelas diferentes repartições em que trabalham e que vão estar a serviço do júri o que é obrigatório. O exercício efetivo da função de jurado constitui serviço público relevante, estabelece presunção de idoneidade moral, assegura prisão especial, em caso de crime comum, até o julgamento definitivo, bem como preferência, em igualdade de condições, nas concorrências públicas.
Os jurados representam a sociedade da qual fazem parte. Quando investidos da função, decidem em nome dos demais. É portanto, o júri, expressão eminentemente democrática, intérprete da vontade do povo, competindo aos que o integram agir de forma independente e magnânima. Por isto, conta com a votação secreta e seu veredicto é soberano.
Os sete integrantes do conselho de sentença, sorteados entre os vinte um convocados para cada sessão, são Juízes de fato. Podem requerer diligências, mais que simplesmente ouvir respostas formuladas pelo Juiz, pela defesa ou pelo Ministério Público, inquirir as testemunhas, valerem-se de quaisquer recursos que os conduzam a um juízo preciso a respeito da decisão a ser tomada. Assim, formam a própria convicção e mediante resposta por um NÃO ou um SIM, cédula que vão depositando numa pequena urna, após cada uma das questões que lhe são propostas, decidem pela inocência ou pela culpa de quem devem julgar.
É a eles que se dirigem o Ministério Público e a defesa, cada qual apresentando sua versão da conduta em julgamento. Em número de sete, jamais corre o risco de ocorrência de um empate na votação. O Juiz de Direito que ali está, preside a sessão, vela pela ordem e pela normalidade dos atos, mas quando ao final, vai prolatar a sentença, estará condicionado ao que lhe tiver sido prescrito pelos jurados, nem mais, nem menos.
Júri popular é portanto, julgamento de alguém do povo, pelo próprio povo.
Aqui em Vitória, acabamos de acompanhar um julgamento cuja duração, três dias, só tem precedente com o do esquadrão da morte. Falo do julgamento do líder dos "sem terra", José Rainha Júnior.
A imputação que lhe é feita data de 1989.
As opiniões se dividem. Para uns, é inocente; para outros, é culpado. Culpado ou não, o povo que estava representado pelos componentes do Conselho de Sentença por 4 votos contra 3, pressionado ou não, dizem que atemorizado pela multidão que postou-se na frente e dentro da Catedral Metropolitana, (onde se permitiu fazer nada menos que tudo), disse que é inocente e só restou ao Juiz Presidente, absolvê-lo.
Uma das duas eram as hipóteses do que sucederia: Rainha é culpado ou Rainha é inocente. Condenado, pairaria a dúvida sobre a efetiva realização da justiça, mas não é que não subsista, agora que foi absolvido.
Ai é que, ainda que hajam divergências entre a culpa e a inocência, num ponto há unanimidade e está na consciência dos longos onze anos que se passaram os quais nos autorizam a voltar a repetir como o fizera Rui Barbosa, na sua Oração aos Moços, (exortação a paraninfados de um curso de Direito): "Mas justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta".

Esse artigo conta alguns anos.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

CRIME DE AUTORIDADE

Está em todas as manchetes de jornais, discute-se em qualquer ambiente e ainda precisa ser intensificado tudo que vem sendo feito para coibir a irresponsabilidade que grassa no trânsito a custo de vidas.
Dizer irresponsabilidade é dar nome à conduta que foge aos padrões da ética em qualquer manifestação. Ricos ou pobres, negros ou brancos, plebeus ou nobres, seja lá o que se for, os padrões morais a serem adotados na convivência harmoniosa e pacífica que todos desejamos entre nós, são os mesmos em qualquer tempo e lugar, não depende da condição social.
Apesar de ignorado, o Código Penal Brasileiro é que descreve a conduta de qualquer agente, para que seja considerada como crime. Não distingue os possíveis réus entre si. Matar alguém é matar alguém seja lá quem for que tiver matado. Investigada a conduta, o que se deve dar a exaustão, os autos chegarão ao Ministério Público para análise. Encontrados inequívocos pressupostos de autoria e materialidade, o órgão procede à denúncia que ao ser recebida pelo Juiz faz deflagrar a ação penal.
O processo tramita nos termos constitucionais: será favorecida a mais ampla defesa e o contraditório. É a oportunidade da verdade o quanto mais límpida possível, de todas as circunstâncias anteriores à consumação delitiva; conhecer-se quem é o denunciado, ou seja, sua história de vida, quais podem ter sido os fatores determinantes da sua conduta, inclusive as reações que sobrevieram.
Assim, habilita-se o Juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, (art 59 CP) à aplicação da pena mediante sentença.
Dito isso, repete-se: todos são iguais perante a lei, consoante art. 5° da Constituição Federal.
Fora dessa regra geral só haverá distinção em se tratando de crimes contra a administração pública, outros crimes em decorrência de função, o crime de improbidade administrativa (Lei n° 8.429/92), e ainda outros específicos.
Nenhum julgamento escapará à consideração das chamadas agravantes e atenuantes e aqui é que pode ocorrer a diferença.
Ante o exposto, evidencia-se que autoridade que comete crime comum passa pelo crivo do mesmo processo comum, em princípio, está sujeito à mesma pena, não receberá pena mais grave em virtude de sua função, poderá recebê-la pela imposição de que tendo melhor discernimento assumiu com mais consciência, o risco pelo mal que praticou.


     

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

DISCURSO DE POSSE

Quando uma escritora é admitida na AFESL cumpre-lhe discorrer sobre a vida de sua Patrona, aquela que dá nome à cadeira que irá ocupar.

Em 5 de maio de 2001, tive essa satisfação e proferi o seguinte discurso.

DISCURSO DE POSSE NA ACADEMIA FEMININA ESPIRITO-SANTENSE DE LETRAS

Cadeira 33 – Patrona: Argentina Lopes Tristão

Marlusse Pestana Daher


20/10/2011
Senhora Acadêmica Maria das Graças da Silva Neves, DD Presidente da Academia Feminina Espírito-santense de Letras

Senhoras Acadêmicas, minha querida mãe, meus familiares, amigos e amigas, senhoras e senhores.

Em pouco mais de seis laudas, escritas em antiga máquina de escrever, ela assim encerrou sua auto biografia: este documento que encerro em cálida manhã do dia 24 de novembro de 1992, foi elaborado no meu “chalet” a Rua Roberto Kautsky, s/n, na cidade de Campinho (Domingos Martins).  E o dedicou a mim, é a mim![1] São exatamente estas as palavras com que o fez: Eu o ofereço a minha possível sucessora na Academia Feminina Espírito-santense de Letras.


        Certamente, D. Argentina jamais pensou que aquela moça com quem um dia conversou em italiano, na sua loja da Rua do Rosário, para quem autografou um pequeno livro, onde reuniu em trovas frases copiadas de pára-choques de caminhão, fosse exatamente, a destinatária desse seu gesto de carinho. Para dizer da minha sensibilidade ao recebê-la, dirijo-me às suas duas filhas, aqui presentes, Diana e Maria da Penha, com meu sincero muito obrigada.

        De quem vem a ter assento em uma Academia se diz que se torna imortal “mas não imorrível” na expressão real e divertida de Murilo Melo Filho. Argentina Lopes Tristão, hoje, mais que ontem, é imortal. Seu nome e sua lembrança não perecerão, porque além de ter pertencido a esta Academia, a cadeira 33, que ora, com orgulho e alegria assumo, tem seu nome.

Quem foi Argentina?  filha de um pai português, Luiz Antonio Lopes e de uma mãe brasileira, Maria Lopes da Cunha,  nasceu aos 14 de abril de 1914, na aprazível região de Monte Belo, em Iconha, neste Estado.


        A família mudou-se pra a cidade de Manhuaçu – MG, quando Argentina tinha sete anos de idade. Ali, a menina cresceu, se desenvolveu e  completou  o curso da Escola Normal Oficial, com defesa de tese sobre “Metodologia do Ensino de Português”.

        Dedicou-se ao estudo da língua francesa, então considerada universal, vindo a dominá-la com fluência, além do italiano e do inglês. Guardou com carinho, nome de Mestres de cujos ensinamentos bebeu, mencionando Dr. Juventino Nunes, um professor de português; D. Maria Batista Nunes,  professora de geografia e história; D. Maria Vicentina Nunes, professora de ciências naturais, física e química e como não poderia deixar, D. Maria de Lucca Pinto Coelho, professora de francês.

        Foi freqüentadora assídua dos vários grêmios existentes na cidade. No Grêmio Literário “Coelho Neto”, encontrou o sabor dos pendores para as letras  aos quais desde então se sentia inclinada.

Pela declamação de poesias, percebeu, como afirmou a “sensibilidade trazida pela musicalidade da palavra que nos torna sensíveis ao aprendizado de outros idiomas”.


        A ela se deveu a mais eficaz projeção do jornal “Idéia Nova”, de nível essencialmente literário, órgão oficial da Escola Normal de Manhuaçu, freqüentada só por moças, editado nas oficinas de um ex-ministro, Dr. Segadas Viana, residente na cidade.

        Lembra da educação para a feminilidade recebida na sua vida estudantil, mas também das aulas de tango, substituindo a ginástica comum. Além das de  arte culinária,  costura e trabalhos manuais, que na minha sensibilidade repercutiu como qualquer coisa lembrando outros tempos,  “o tempo de cabeça, do limão de cheiro, negro do recado, ...”[2]

        Confessou-se admiradora de todos os gêneros literários, mas “inimiga ferrenha da escabrosidade na poesia”, como se quisesse reafirmar que: se a palavra que disposta em versos não conseguir provocar aquele arrepio que brota da mais perfeita sensação de beleza, se não provoca emoção, poesia não é.

        Cultuou Catulo da Paixão cearense como o poeta sertanejo por excelência, além de José da Luz. No ápice de sua produção literária, quem mais a teve foi a trova que denominou “eficientíssimo veículo de comunicação entre poetas” De fato, fiquei sabendo que era em trova que se correspondia freqüentemente, por exemplo, com o Acadêmico Humberto Del Maestro, outro trovador capixaba, que a brinda e homenageia, dotando a  “A F E S L”  com algumas dessas pérolas.

        Foi membro do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo, da Associação Espírito Santense de Imprensa, além de presidente de honra da Casa da Cultura de Afonso Cláudio – ES. Primeira trovadora a se inscrever Clube de Poetas e Trovadores de Salvador - Bahia. Reuniu em seu currículo, inúmeros certificados de participação em diversis  eventos pelo Brasil e  no exterior.

        Deixou três pequenos livros de “trova adivinha”, “Legendas de pára-choque”, também em trovas. Em sonetos: “Cadeia de Sonhos”; “Cenas da Vida Diária” (crônicas), um livreto com o título de “Sonetilho”; em poema livre, deixou a “História de Afonso Cláudio” (de sua fundação a 1930); “A Trova Adivinha” em parceria com Amália Max (do Paraná); “O Menino José” é obra com que resgata  história da vida de José Ribeiro Tristão, “esse grande administrador de empresas de saudosa memória”, afirmou ela.

        Muito jovem, três meses e três dias após terminar os estudos, desposou Raymundo Ribeiro Tristão, com quem teve três filhos, Luiz Misael Lopes Tristão, já falecido; Diana Lopes Tristão e Maria da Penha Tristão de Souza que lhe deram nove netos.

        Por influência do marido, ocupou-se por muitos anos no comércio, onde sua  alma de poeta deu vez à estilista incomparável no seu tempo. Muitas foram as noivas que no dia maior de suas vidas, subiram ao altar vestidas sob inspiração de D. Argentina. De fato, ela até registrou em suas memórias, a dedicatória lançada pela também acadêmica, Magda Lugon, no seu livro “Pequena Flor”: “Para minha querida Argentina, que com sua arte, criou-me o mais lindo vestido que jamais exibi em minha vida: o meu vestido de noiva”.
       
        Na hora que julgou chegada, D. Argentina deixou as demais atividades, deixando permanecer intata a trovadora e escrevia freqüentemente.

        No seu chalé em Domingos Martins, premiada pela natureza, deu asas aos sentimentos que se afloravam, não se podava e assim era que se divertia com o bando buliçoso da garotada da rua, deliciando-se  em banhos inesquecíveis em sua piscina. Quando recriminada por algum familiar, respondia que era muito bom ouvir toda aquela algazarra, música impagável.  Outra prova do quanto com os garotos se identificava se traduz no contato com aqueles que invadiam a Praça Costa Pereira, a quem fornecia lanche e  falava da presença de Deus que tudo vê.  Um Deus que cultuou sempre ainda que jamais se tivesse ligado aos preceitos de uma religião.

        No dia 22 de maio de 1999, Argentina Lopes Tristão aceitou um convite para uma seresta em cuja oportunidade seria mais uma vez homenageada, na Casa da Cultura em Afonso Cláudio. Na hora precisa, dirigiu-se para lá onde era esperada pelo Senhor da Vida que diligenciaria seu regresso à casa do Pai.

        A festa da terra murchou, mas foi um espetáculo a que aconteceu no céu! Os amigos da terra não conseguiram sufocar o pranto, mas os do céu vibravam com a chegada de Argentina.

Na Igreja católica, comemorava-se a festa de Santa Rita de Cássia, gostam de lembrar seus familiares, que exatamente por isto, como que se sentem de certa forma recompensados, pela incomparável perda.

Na busca de uma sua palavra para constituir em síntese do seu testamento literário, respaldando a afirmação de sua filha, Maria da Penha, que a definiu como “uma mulher  sintonizada com as causas e as coisas do seu tempo”  escolhi duas trovas:

“Eu tenho um profundo amor,               “O gesto vil do atentado
Ao irmão deficiente,                           De conseqüências insanas
Pois o grande Deus Senhor,                 Que torna animalizado
Não vê ninguém diferente”.                 O uso das forças humanas”.

Esta fala se restringe ao canto sobre a Patrona da cadeira que passo a ocupar. No entanto, como já me acostumei a ser repetidamente perdoada, quando externo minhas irresignações, espero que mais uma vez, assim aconteça. É que não posso sufocar um sentimento profundo que me possui:  o da mais  sincera e profunda gratidão às Acadêmicas que  generosamente referendaram meu nome, tornando-me integrante dessa Casa, onde doravante espero estar contribuindo na defesa dos objetivos que se propõe.  Ajudem-me, também lhes peço, para que a cada dia seja menos incapaz e envide os melhores  esforços,  na defesa da Língua Brasileira, na sua mais alta expressão.

        Nem posso deixar de citar os amigos que me alimentam com o incentivo da presença e da amizade; a minha família que aqui está, participando comigo da grandeza e da magnitude desta hora, principalmente à minha mãe, a quem dedico este momento.

        Sobretudo e sobre todos a Deus,  que me dotou dos  dons que tornaram ser possível, ser  aceita e estar aqui e por tudo o mais que nem conheço e nem sei! 


[1] Entendi depois, sua sucessora foi Berenice Heringer na Cadeira 3. Patrona Virgínia Gasparini Tamanini.
[2] “Tempo de cabeça, / do limão de cheiro, / negro do recado, / bilhetinho pro seu bem amado,/ saias engomadas, gola no pescoço, faces em rubor,/ só em pensar no primeiro amor,/ se papai queria,/ mamãe concordava,/ o noivo aparecia,/ já vestido para casar,/ que importava se não se gostassem,/  primeiro casassem/ pra depois se amar./ Tirutiruri, que bom,/  tirutiruri, perdão,/ ó vovó, me desculpe,/ mas esse tempo não servia não”...