Adriana Gusmão
Ao
raiar o dia, minha porta se abre em silencioso convite para a entrada da brisa
matinal. Uma densa neblina dificulta a visibilidade. Ouço vozes que tão cedo já
trafegam pela movimentada avenida em que está localizada minha residência. São
trabalhadores que como eu, madrugaram para “enfrentar” a fila por água potável!
Tão escassa, tão preciosa, tão desejada, tão essencial fonte de vida, a água
vai evaporando...
Hoje,
insuficiente até para gotejar em nossas torneiras, se faz reflexo da
mediocridade com a qual lidamos com os bens procedentes dos recursos naturais.
A ganância humana pôs preço sob o que é dádiva da natureza! A necessidade pelo
bem primordial à vida – a água; obriga-nos a pagar duplamente pelo uso dos
ofícios públicos, essenciais, vitais! Aliás, fica até difícil o cálculo de
“quantas vezes mais” paga-se pelos insuficientes serviços prestados!
Um
senhor de meia idade “abre” sua banca de jornal. Penso na manchete que
antecederia uma matéria que o jornalista e escritor Euclides da Cunha
publicaria se ainda estivesse entre nós: "Não
‘acudiram’ Os Sertões, agora eles dominaram o Brasil!”. Na virada do
século, 1800-1900, estava ele em Canudos como correspondente da imprensa... Mas
fez mais que notícias, reportagens, documentários... Euclides fez denuncia
social! E, no capítulo introdutório, delatou o descaso ante a degradação dos
recursos naturais e urgente necessidade de “salvar” o que se restava (sim, pois
já não resta mais!) de uma natureza que ainda clama por atenção e urgentes
cuidados... Não queremos viver nos sertões... Também não queremos que
gracilianamente nossas vidas se tornem tão secas a ponto de pensarmos como
Fabiano que “apanhar do governo não é desfeita”, que o tal do juro, do imposto,
o governo, o patrão, minguem nosso precioso ordenado... Mas o progresso nos acompanha, a ganância nos
cega, o consumismo esgota os sensos de humanidade e harmonia sobreviventes em
nós! Precisamos de coisas...

A neblina agora já subiu e, a fila, cresce
significativamente. Talvez “A guerra do
fim do mundo” do peruano Mário Vargas Llosa narrando ficcionalmente a
“Guerra de Canudos”, publicada quase oitenta anos depois, literatizando fatos
seja mais interessante... Poeticamente, até a morte vira descanso e nascem rios
de lágrimas! Mas Llosa, certa vez comentou que era preciso desconfiar das
utopias, pois elas terminam, em geral, em holocaustos. Que há uma estranha
verdade na política, que consiste em que as soluções medíocres costumam ser as
melhores soluções... Será essa opinião um fato?! Segundo o autor, não há outra
saída, na política, que não seja o realismo...
― Oh, sim, por favor! Pode encher “meus baldes”! Aceita pagamento com
cartão de crédito?