Na manhã de hoje, de sol
esplêndido e apenas algumas nuvens mais ousadas, talvez porque fossem tão
lindas e suaves, se interpunham à visão plena do céu de infinito azul. Sai de
casa para um desses afazeres comuns e necessários a todos nós, ir a um banco,
ao supermercado, ao correio, buscar alguma coisa em algum lugar.
No primeiro momento, confesso, fui possuída de certo temor, inúmeras hipóteses acorreram a minha mente, vivemos sentindo medo... Mas bastou erguer o olhar para de imediato, sentir imensa quietude, agora, possuída da certeza de que se tratava de um tipo que não pretendia fazer mal algum a ninguém. Seu semblante era de quem refletia.Cabeça inteiramente coberta pela neve do tempo, barba feita, face quase rosada, como de alguém que todo dia sai de casa e vai tomar um pouco de sol. As roupas que não chegavam a ser surradas, também não revelavam que fosse o caso de se colocar fora de uso. Estava calçado. O corpo vergado denotava seu avanço em anos.
Queria apenas falar alguma coisa.
Claro que me dispus e na melhor atitude que encontrei coloquei-me em atitude de
escuta diante dele. Ao notar a placidez
daquela face, olhar distante de mim, repreendi-me por ter julgado que não
obstante a aparência, e, certamente não precisar, fosse do tipo que pede
dinheiro.
Há gente assim, por duas vezes,
em um mesmo supermercado, com narrativa da mesma história deparei com velho
conhecido, fora funcionário de banco. Passava
necessidade... e deixei-me cair em
“autêntico conto do vigário”. Da segunda vez, não, além de lhe ter acrescentado
doces, mas firmes palavras de repreensão. Só vi, quando se esgueirando entre
prateleiras, sumiu para sempre. Nunca mais o vi.
![]() |
Era só uma lição de amor |
Meu interlocutor, ao invés, só
queria ser ouvido. Ele sim, bem que gostarei de reencontrar muitas vezes. Sem preâmbulo, objetivamente, como se
fôssemos velhos amigos, ou retomássemos um discurso inacabado, como se
tivéssemos travado outros tantos diálogos, foi-me perguntando, simplesmente: - Alguém pode se esquecer de alguém que o tenha
tratado com carinho?
Não podia ser outra minha
resposta: - claro que não. Nem sei se era o que queria ouvir, não sei sequer se
queria alguma resposta, do mesmo modo que chegou, prosseguiu seu caminho. Ainda olhei para trás e só vi um
homem seguia.