Onde canta o Sabiá;
As aves que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Em cismar, sozinho, à noite,
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar - sozinho, à noite -
Mais prazer encontro eu lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que desfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá."
Canção do exílio é o poema de Gonçalves Dias
que abre o livro contos literários e marca a obra do autor como um dos
mais conhecidos poemas da língua portuguesa no Brasil. Foi escrita
em julho de 1843,
em Coimbra,
Portugal.
O poema, por conta de sua contenção e de sua alusão à pátria distante, tema tão
próximo do ideário do Romantismo, tornou-se emblemático na cultura brasileira.
Tal caráter é percebido por sua freqüente aparição nas antologias escolares,
bem como pelas inúmeras citações do texto presentes na obra dos mais diversos
autores brasileiros.
Sua temática é
própria da primeira fase do Romantismo brasileiro, em sua mescla de nostalgia e
nacionalismo - o tema do exílio, da saudade da terra natal prestava-se à intenção de
criar símbolos poéticos que funcionassem ao mesmo tempo como símbolos
nacionais. Gonçalves Dias compôs o poema cinco anos depois de partir para
Portugal, onde fora cursar Direito na Universidade de Coimbra.
A Canção do
exílio teria inspiração na obra Canção de Mignon, pertencente ao
livro Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister de Johann Wolfgang von Goethe, da qual
Gonçalves Dias usa alguns versos como epígrafe, embora a maioria das antologias
escolares não apresente a epígrafe em alemão.
O texto é
estruturado a partir do contraste entre a paisagem europeia e a terra natal -
jamais nominada, sempre vista com o olhar exagerado de quem está distante e, em
sua saudade, exalta os valores que não encontra no local de exílio. A
construção patética (de pathos, comoção) é feita pela repetição das
idéias expostas nos versos iniciais e pela súplica dos últimos versos:
Não permita Deus que eu morra
Sem que eu volte para lá
Sem que desfrute dos primores
Que não encontro eu cá
Sem qu'inda aviste as
palmeiras
Onde canta o sabiá
O poema é marcado
por uma contenção formal, uma economia de termos e um cuidado métrico que seria
aos poucos abandonado pelos poetas românticos posteriores. Sua forma
equilibrada tornou-o material perfeito como texto declamatório. A grande
exposição do poema ao longo da história literária brasileira teria, para alguns
autores, banalizado a criação ao ponto de extrair do leitor contemporâneo o
impacto inicial de seus versos.