Fabiani
Rodrigues Taylor Costa é formada em
Letras, Especialização em Literatura
Brasileira e Gestão Escolar. É Diretora da
EEEFM Profª Filomena Quitiba
em Piúma ES, venceu o concurso de crônicas da Academia Feminina
Espirito-santense de Letras
e o de artigos da Academia Mateense de Letras - AMALETRA
CARTAS
Que bom que hoje conseguimos resolver muitas coisas
apenas com um clique. As informações são armazenadas em uma pequena caixa que
chamamos de CPU, fios tomam conta cada vez mais de paisagens antes iluminadas à
luz de velas ou de lampiões.
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Fabiani na premiação da AFESL |
Do outro lado do computador existe uma pessoa a
qual muitas vezes nunca vi ou nunca verei na vida. Mas, comunico-me com ela,
somos “amigas“ em uma corrente que acreditamos ser eterna.
Não sinto o seu cheiro, não sei se a foto postada é
ela mesma, não sei se ri ou se chora, se edita a verdade ou exclui as mentiras,
se escreve somente aquilo que acredita que vai me agradar, mas, não importa,
ela não vê meus sentimentos e emoções.
É quando me pego em lembranças de como era escrever
uma carta. Aqueles cadernos antigos eram despertados do velho baú para servirem
de rascunho.
Os sentimentos de amor, paixão, saudade eram bordados
em lindas letras redondas, visualizadas em infinitas páginas que justificavam
até a troca da cor da tinta da caneta. E o cheiro? Antes de fechar o envelope,
este, era posto perto do coração e, através de um longo suspiro, mais uma vez
aqueles belos papéis de carta eram relidos e o toque final era uma gota do
melhor perfume para que, quem recebesse, sentisse a presença do ente amado.
Porém, se o assunto fosse uma briga, o papel
entrava no envelope de tal forma que o amarrotava completamente. A letra ia num
garrancho, transparecendo a raiva daquele instante.
Chique era usar o P.S. (post scriptum). Na época, nem sabia o significado, mas tinha
conhecimento de que se usava no final da carta. Usar o P.S. era deixar exalar
certa inteligência, era o bater do martelo para a conquista final.
O bom mesmo era esperar pela resposta. Em quantas
mãos a carta iria passar ainda para chegar ao seu destino? Grandes expectativas
iam para bem longe, num retângulo cheio de esperanças.
E vinha o carteiro, jogava a correspondência por
debaixo da porta. Não tinha emoção abri-la apressadamente. O ritual era olhar
primeiramente o remetente, como se não soubéssemos quem era. Depois, aos
poucos, rasgávamos um dos lados e retirávamos seu conteúdo com o coração aos
pulos.
O cheiro que de lá aspirava, era concretizar a
pessoa ali perto de você. Ler, aquelas traçadas linhas, era ouvir, pertinho do
ouvido, o sussurro de quem as escreveu.
Nunca mais recebi uma carta. Minha caixa de e-mail
está cheia, deleto quase tudo, não é importante.
Saudade mesmo é daquelas respostas que jamais
chegarão.
VÁRIOS TONS DE LIBERDADE
Já faz tempo que os afazeres domésticos e a
submissão da mulher para com o marido ficaram para trás.
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Fabiani |
Todas as manifestações, transcorridas pela mulher
na construção de sua história, mostram cada passo percorrido, cada obstáculo
vencido para um apogeu de liberdade e plena autonomia em muitas decisões.
Simone de Beauvoir afirma em seu livro O Segundo
Sexo (1949) que “Ninguém nasce mulher: torna-se mulher. Nenhum destino
biológico, psíquico, econômico define a forma que a fêmea humana assume no seio
da sociedade; é o conjunto da civilização que elabora esse produto
intermediário entre o macho e o castrado que qualificam de feminino.”
E foi lá da obscuridade do analfabetismo, pois as
letras eram-lhe negadas, que a mulher, aos poucos, surge das cinzas, feito
Fênix, e descobre o seu poder com as palavras e as transpõe através de
protestos, abrindo caminhos definitivos na sociedade.
Sua única visão diária eram os limites que
demarcavam sua casa. Com a Revolução Industrial, era preciso mão de obra para
tantas fábricas emergentes. Saiu para trabalhar. O resultado final, modelado
pelas mãos femininas, agradou tanto que hoje, além de operária, comanda
fábricas, ganhando altos salários.
Todas as suas perspectivas estavam em volta de um
casamento, na maioria das vezes, arranjado. Vivia numa eterna submissão, pois
até os bens herdados passavam para o nome do marido, deixando-a presa a um
casamento sem afeto, acorrentada à situação financeira masculina.
Mas, um dia, o divórcio não foi mais escândalo
social. Penetrando no mundo das leis, decisões enérgicas e significativas foram
tomadas e os ferrolhos da escravidão patriarcal foram serrados. Com os punhos
livres, as mulheres arregaçaram as mangas e foram trabalhar para o próprio
sustento e também de seus filhos.
Agora, é de sua vontade o casamento, podendo até
mesmo negar o sobrenome do marido, bem como, ter pleno poder sobre seu corpo em
orgasmos e na decisão de ter filhos.
Infinitas possibilidades foram absorvidas pelo sexo
que achavam que fosse frágil. Não só a voz foi ampliada em megafones espalhados
sociedade afora. O direito de decidir os governantes do seu país se concretizou
no poder do voto e a cada ano caminha com orgulho, cabeça erguida, vitoriosa em
muitas batalhas.
É certo que em todo o caminho trilhado, mulheres
sofreram, humilhadas, engolindo o choro amargo do descaso masculino, quando
não, perdiam a própria vida na luta por futuras causas.
Assim se fez, entre a simbologia do queima sutiãs,
passeatas, cartazes em punho, foi traçado um árduo caminho. Muito ainda se tem
para vencer, mas o grande percurso já completado mostra a mulher, com seus vários
tons de liberdade, detentora do poder de tomar suas próprias decisões.