Chegadas ao quinto ano do curso
de medicina, Bárbara e Stella, ambas com apenas 21 anos, endossando os
respectivos jalecos brancos, cheias do sentido de que já são meio médicas, entram
pela primeira vez, no hospital-escola onde passarão os próximos dois anos para
a prática, tempo necessário que lhes assegura concretizar o que estudaram em
livros, apostilas, artigos, laboratórios, em aulas, ouvindo conferências, até a colação de grau.
Será aquele dia bonito em que por
ordem alfabética, serão chamadas pelos nomes e rumarão ao palco onde ocuparão seus lugares em assentos prévia
e laboriosamente preparados. A oitiva do nome de cada uma, da multidão presente,
parentes e amigos, ressoarão aplausos, até “apitaço”, divisar-se-ão faixas alusivas,
enfim, uma verdadeira festa que tem outros momentos, mas entre os quais se
destaca o da colação-de-grau, quando erguem orgulhosamente o diploma que acabam
de receber, posam com paraninfos, patronos e professores, sem nunca deixar que
se apaguem dos lábios, o melhor dos sorrisos.
Entre saber e assistir e
protagonizar como se dão os atos de atendimento a doentes de todos os tipos, há
uma grande diferença, tudo acaba por se afigurar como extremamente novo. Os
doentes se entregam aos cuidados delas que examinam, tiram do pescoço o
estetoscópio, medem punhos, auscultam corações, enfim, procedem a tudo como
sempre deve ser e finalmente emitem o diagnóstico.
Sempre juntas, entreolham-se com
frequência, trocam ideias enfim, somam conhecimentos e dobram capacidades.
É um frenesi, máxime, em se
tratando de hospital público. Na entrada, há sempre um general-comandado que
fiscaliza e só à sua ordem, o paciente adentra corredores para chegar ao tal
consultório que lhe foi indicado.
Mas há sempre o acontecer de uma
exceção. Paciente grávida, entra correndo, vai logo lhes dizendo que já está em trabalho de parto. Antes de
ser atendida, pergunta pelo WC que divisa, sem receber resposta, corre na
direção, entra, nem fecha a porta e as duas ouvem um grito: “está nascendo”!
Entreolham-se atônitas. Stella não hesita, acorre, antes que o bebê irrompa de
todo, o segura e é de se imaginar a apoteose: uma mulher ainda sentada num
vaso, elimina a placenta, se contorce, enquanto a futura médica que sequer tivera tempo de
colocar luvas, segura o bebê entre as mãos, ergue-o o mais que pode e fica ali a espera de um médico para o corte
do cordão umbilical.
E cerra-se a cortina do primeiro
ato de uma vida.
Jaleco todo sujo, precisa ser
trocado. Depois, mãos lavadas e desinfetadas, as duas visitam mãe e filho, foram
cuidados e prontos para viver.
Seus corações saltitam de emoção
e alegria. Viveram uma, entre tantas emoções que ainda vão vivenciar “no
internato” e depois, no exercício quotidiano da profissão de Hipócrates.
Ser médico é lutar pelas vidas e
dar vida a quem a tenha ameaçada.
De volta à casa, o assunto não
podia ser outro: contaram orgulhosamente com riqueza de detalhes aos pais e aos
familiares, a avós, (eu mesma ouvi de uma dessas) a outros colegas, a outras
pessoas de sua convivência. E vibram!
O tempo vai passar, nem Stella,
nem Bárbara olvidarão o dia em que uma mulher em trabalho de parto, adentrou a
sala onde estavam e no banheiro em que precisou ir, nasceu o filho que esperava
e que antes de cair dentro do vaso, foi erguido, por uma quase médica, como se
ergue um troféu.