11 da manhã. Olho pela
janela para confirmar o silêncio que ouço. Ninguém passa pela rua, vejo alguns
carros, todos parados, certamente, desde ontem, porque é Natal!
Mesmo os que não creem se
contagiam com o clima que invade a alma de todos. Sem poder fazer diferente,
automaticamente, acabam por se deixar invadir pelos anelos natalinos e provam
da mesma harmonia, da mesma paz, enfim, encontram-se com as próprias origens e
assim vão estar.
Enquanto assistia a Santa
Missa na igreja de São Francisco, ontem, deixei-me possuir por um pensar em
Maria, sobre quais eram seus sentimentos, como terá vivenciado aquelas horas
até os momentos mais próximos, os que precederam o nascimento do Filho de Deus
sim, mas humano e portanto fruto de sua carne, de seu sangue, da sua vida. Se
os filhos têm semelhança física com os pais, Jesus só tinha da parte de Maria.
Fixo o semblante doce da
Nazarena e deduzo que aquelas expressões afogadas por antecipação no sacrifício
redentor do Filho, ainda assim, traduzem um misto de decepção ou tristeza santa,
pois, pelas atitudes com que seus concidadãos se conduziam era fácil não
esperar eloquência ou boas vindas ao “Verbo de Deus que se fez carne e estava
prestes a habitar no meio de nós”.
Ainda assim, era também
muito de Maria a expressão “eu sei em quem confiei e estou certa” dai tantas
vezes se repetir a seu respeito que “guardava todas as coisas em sem seu
coração”.
Contemplo-a ao dizer sim
até à vontade prepotente do governante. Toma o caminho de Jerusalém em
companhia de José, já lemos muitas vezes, mas poucas vezes teremos ficado
analisando quais eram os pensamentos que passavam por sua cabeça, ainda que dessa
profunda função litúrgica, participasse apenas o silêncio.
Encostam a porta da casa, saem,
o sol ainda não despontara e a caminhada inicia. Havia gente falando alto e até
dando risadas, numa tentativa de amenizar os inconvenientes e o cansaço inevitável
que a ninguém excluiria. Não era o caso de Maria, silenciosa e disposta a
sempre ouvir, mas a igualmente praticar o gesto simples de quando ao passarem
por algum regato de águas cristalinas, ela também se inclina para matar a sede.
Naquela manhã, por estas
exatas horas, estava ocupada com o recém-nascido, procurava proporcionar-lhe
todo carinho que um serzinho requer apenas chegado a luz. Tinha satisfeito sua
expectativa de ver aquele rosto do Deus-criatura que se fizera carne e se
desenvolveu no seu ventre.
Os pastores que a convite
dos anjos foram ver o menino, fascinados, alguns ficaram por ali mesmo enquanto
outros terão voltado às próprias casas, para avisar aos familiares e aos
vizinhos o que aconteceu e viram, pelo que é fácil deduzir que terão dito do
quanto eram pobres e não tinham alimentos. Cada família acorreu às despensas,
recolheu o que tinha, preparou como melhor foi possível, embalou e ainda mais
numerosos chegaram à gruta de Belém.
Maria e José recepcionam
todos com o melhor dos sentimentos. Única a sensação que a todos envolve, são
muito benvindos.
Certamente, depois dos
primeiros gestos, das saudações, começa a ser posta a grande refeição. Não
havia mesa onde sentarem em torno, tudo era servido de forma mais que simples,
coletivamente, em comum. Cada simples pirão tinha a diversidade dos sabores de
todas as iguarias, todos se fartaram em alegria.
Maria e José agradecem e
não obstante a pequenez do recém-nascido, paira uma sensação de que ele também
se tenha manifestado de forma a que todos percebessem, mas ninguém falou. Afinal
de contas, uma criança que acaba de nascer só faz dormir.
Regressar se tornou difícil,
melhor que pudessem ficar ali para sempre, mas tinham que retornar à casa, ao
pastoreio, ao dia-a-dia que lhes era peculiar.
Foram narradas coisas que
dos Evangelhos não constam? que importa, são cenas humanas como era humana em
todos os aspectos a Família de Nazaré, que nossa devoção denomina Sagrada
Família.