segunda-feira, 25 de maio de 2015

GUARDA PARTILHADA

Daniel Sampaio
Em Portugal, nos últimos trinta anos, é inquestionável a mudança no quotidiano das famílias. Da esposa/mãe típica da primeira metade do século passado, evoluímos para uma maior colaboração do pai nas tarefas domésticas e uma acrescida cooperação na educação das crianças.
Estas mudanças, que se acentuaram sobretudo no Portugal democrático, traduziram-se também por uma muito maior responsabilização do pai em relação aos filhos. O pai distante e centrado na vida profissional, deu lugar a um pai mais próximo e interveniente, preocupado com o futuro dos filhos e atento ao seu desenvolvimento.
O conceito de guarda conjunta nasceu nos anos setenta, a partir de vários movimentos sociais que denunciaram os problemas da guarda monoparental, pelo risco de perda, por vezes definitiva, de um dos progenitores (quase sempre o pai). 
A guarda conjunta pressupõe a co-responsabilidade legal de ambos os progenitores em relação aos filhos, após a ruptura do seu casamento ou união de facto. Trata-se da modalidade de organização da vida familiar que mais se aproxima da realidade da família intacta, pelo que se justifica a sua prática, sempre que possível.

Se a guarda conjunta deve ser o princípio norteador fundamental, há situações em que pode não ser aconselhada. Quando existe patologia mental grave num dos progenitores (devidamente comprovada), negligência mantida, violência familiar ou conflito extremamente intenso na fase da rutura, outras formas de organização dos tempos da criança devem ser ponderadas.
Mais recentemente, utiliza-se o termo guarda partilhada como sinônimo de responsabilidade parental conjunta. No entanto, convém esclarecer que guarda partilhada não significa que haja necessariamente residência alternada. A lei portuguesa determina os pressupostos da regulação das responsabilidades parentais, podendo os pais solicitar ao tribunal a alternância da residência. O que está em causa na guarda partilhada é a partilha da autoridade parental sobre a criança, que passa a ser exercida por ambos os progenitores. 
A guarda partilhada constitui uma importante evolução no conceito da educação das crianças no pós-divórcio."
A guarda partilhada, sob a forma de residência alternada, tem a sua justificação no facto da criança passar a viver o seu quotidiano com ambos os pais. Se os progenitores forem capazes de ultrapassar as divergências e colocarem o bem-estar do filho em primeiro lugar, podem conseguir um bom equilíbrio relacional.
Do ponto de vista dos pais, a residência alternada também pode ter vantagens. Desfaz a ideia da educação das crianças estar apenas a cargo de só uma pessoa, crença frequente quando as responsabilidades parentais atribuem, a um dos pais, um contacto apenas quinzenal. Permite uma diferente organização da vida pessoal de cada adulto, com mais intensa dedicação ao filho no período em que coabitam.
A guarda partilhada constitui uma importante evolução no conceito da educação das crianças no pós-divórcio. 
De notar que a residência alternada nunca deverá ser proposta se os progenitores passarem a viver em zonas distantes, o que torna inviável a constante deslocação da criança entre cidades muito afastadas.
Quando é elevada a intensidade do conflito entre o casal no momento do divórcio, a guarda partilhada torna-se difícil. Nessas situações, é melhor aconselhar a mediação familiar, com vista a obter um acordo que possa ser cumprido.



CURIOSIDADES SOBRE O VOTO FEMININO



Bem que os homens tentaram. Em 1890, durante a elaboração da primeira Constituição republicana, o constituinte baiano César Zama defendeu o sufrágio universal. No ano seguinte, 31 constituintes assinaram a emenda de Saldanha Marinho ao projeto de Constituição, estendendo às brasileiras o direito de votar. Mas em plenário as decisões foram desfavoráveis e, assim, o Brasil perdeu para a Nova Zelândia (em 1893) a primazia na concessão do voto às mulheres.

Homens e mulheres que se dedicaram à luta por esse direito estão tratados em pé de igualdade no trabalho A mulher e voto, realizado pelo advogado e pesquisador Antônio Sérgio Ribeiro, com a elaboração dos funcionários do Parlamento paulista Dainis Karepovs, Álvaro Weissheimer Carneiro, Caio Silveira Ramos e Naiara Reis de Almeida, além do professor Abel Cardoso Jr., da Academia Sorocabana de Letras, e de Maria Ema Melo Rabelo Silva, da Câmara dos Deputados.

A pesquisa, que relata a história do voto feminino no mundo, será publicada neste jornal em três edições. Ao tratar do Brasil, ela acompanha desde precursoras como Leolinda de Figueiredo Daltro e Bertha Lutz, até a época contemporânea

/N+/A mulher e o voto - II/N-/    

Antonio Sérgio Ribeiro

No Brasil, a emancipação feminina teve como precursora a educadora Leolinda de Figueiredo Daltro, natural da Bahia. Exerceu o magistério em Goiás, onde trabalhou na catequese dos silvícolas. Transferindo-se para o Rio de Janeiro, se tornaria professora catedrática municipal e chegaria à direção da Escola Técnica Orsina da Fonseca. A fim de colaborar na campanha eleitoral para a presidência da República, fundou, em 1910, a Junta Feminina Pró-Hermes da Fonseca, de cuja família era amiga, apesar de as mulheres não terem direito do voto. Com a vitória de seu candidato, continuou sua campanha pela participação da mulher brasileira na vida política do país. Concorreu como candidata à Constituinte no ano de 1933.

Ao contrário de outros países, o movimento pelo voto feminino partiu de um homem, o constituinte, médico e intelectual baiano César Zama, que, na sessão de 30 de setembro de 1890, durante os trabalhos de elaboração da primeira Constituição Republicana, defendeu o sufrágio universal, a fim de que as mulheres pudessem participar efetivamente da vida política do país. No ano seguinte outro constituinte, Almeida Nogueira, defendeu a participação das mulheres como eleitoras, e lembrou, na sessão de 2 de janeiro de 1891, que não havia legislação que restringisse seus direitos e mesmo o projeto da nova Constituição não cerceava esse exercício cívico. No mesmo raciocínio, Lopes Trovão, ao discutir a Declaração de Deveres, usou da palavra para defender com afinco essa causa, que para ele era como uma reparação que vinha tardiamente. Suas palavras foram contestadas com apartes veementes dos adversários da idéia, mas a cada frase, ele contestava com idêntico vigor.    

Mas os inimigos eram fortes e em maior número. Entre os que rejeitavam a idéia estavam Lauro Sodré e Barbosa Lima. Cabe citar que, no primeiro dia do ano de 1891, 31 constituintes assinaram uma emenda ao projeto de Constituição, de autoria de Saldanha Marinho, conferindo o voto à mulher brasileira.     

Apoio retirado   

A pressão, porém, foi tão grande que Epitácio Pessoa (posteriormente presidente da República, em 1919-1922), que havia subscrito a emenda, dez dias depois retirou o seu apoio. Entre aqueles que foram signatários da emenda constitucional estavam Nilo Peçanha , Érico Coelho, Índio do Brasil, César Zama, Lamounier Godofredo e Fonseca Hermes. Na sessão de 27 de janeiro de 1891, o deputado Pedro Américo assim falou:       

"A maioria do Congresso Constituinte, apesar da brilhante e vigorosa dialética exibida em prol da mulher-votante, não quis a responsabilidade de arrastar para o turbilhão das paixões políticas a parte serena e angélica do gênero humano."      

Outro parlamentar, Coelho Campos foi mais radical em seu pronunciamento:

"É assunto de que não cogito; o que afirmo é que minha mulher não irá votar."

O próprio Ruy Barbosa e o Barão Rio Branco se manifestaram em defesa da igualdade política dos sexos, mas o Brasil deixou de ser o primeiro país do mundo a conceder o direito do voto à mulher. Em 1893 a Nova Zelândia teria a primazia da concessão do voto feminino.  

O constituinte e defensor da cidadania para a mulher brasileira, César Zama, em discurso afirmou:   

"Bastará que qualquer país importante da Europa confira-lhes direitos políticos e nós o imitaremos. Temos o nosso fraco pela imitação."   

No ano de 1894, foi promulgada a "Constituição Política" da cidade de Santos. Entre as normas legais estava o artigo 42, que concedia a "capacidade política aos maiores de 21 anos e as mulheres sub juris, que exercessem profissão honesta, sabendo ler e escrever e residindo no município há mais de um ano, o direito de voto". Não concordando com esse diploma legal, um grupo de cidadãos entrou com recurso no Congresso Legislativo de São Paulo: o Projeto nº 120, de 1895, que solicitava a anulação de alguns artigos, entre eles o artigo 42. O relator acatou a solicitação, mas o deputado Eugênio Égas foi mais "prático": apresentou um projeto de resolução com apenas dois artigos, o primeiro declarava nula a "constituição santista" e o segundo artigo revogava as disposições em contrário...

Em Minas Gerais, no ano de 1905, três mulheres se alistaram e votaram, mas foi um caso isolado.    

Somente em 1917, o deputado Maurício de Lacerda apresentou a emenda nº. 47, de 12 de março daquele ano, que alterava a lei eleitoral de 1916, e incluía o alistamento das mulheres maiores de 21 anos. Essa emenda seria rejeitada pela Comissão de Justiça, cujo relator Afrânio de Mello Franco a julgou inconstitucional e ainda afirmou: 

"As próprias mulheres brasileiras, em sua grande maioria, recusariam o exercício do direito de voto político, se este lhes fosse concedido."    

Seu autor não desistiria da idéia e, em 29 de outubro de 1920, na legislatura seguinte, novamente apresentou uma emenda, que recebeu o nº. 8. Dessa vez iria para votação no plenário da Câmara Federal, sendo mais uma vez rejeitada. No ano seguinte um projeto de lei seria apresentado - de autoria de três deputados: Octavio Rocha, Bethencourt da Silva Filho e Nogueira Penido - e receberia parecer favorável do relator deputado Juvenal Lamartine de Faria. Mais uma vez não lograria êxito a iniciativa. Em 1º de dezembro de 1924, é apresentado pelo deputado Basílio de Magalhães o Projeto de Lei nº. 247, que pleiteava a concessão do voto à mulher brasileira. 

Primeira prefeita

No Senado coube ao representante do Pará, Justo Leite Chermont, em 1919, a iniciativa pela concessão do voto feminino, quando apresentou o projeto de lei nº. 102, que seria aprovado em primeira discussão no ano de 1921. Em fins de 1927, o presidente Washington Luís, em conversa no Palácio do Catete, manifestou-se a favor do voto às mulheres. O presidente da Comissão de Justiça do Senado, Adolpho Gordo, localizou no arquivo o antigo PL nº. 102 (seu autor, o senador Chermont havia falecido em 1926) e o colocou em pauta novamente. Foi designado relator o senador Aristides Rocha, que em parecer se pronunciou favoravelmente ao projeto original. Havia, porém, outros posicionamentos, notadamente do senador Thomaz Rodrigues, que em 10 de setembro de 1925, quando relator do referido projeto, assim se pronunciou:       

"Apesar de entendermos que é cedo, muito cedo, para conceder um direito tão amplo à mulher brasileira, que, em sua grande maioria ainda o não reclama..." A segunda votação necessária à aprovação não se realizaria. Thomaz Rodrigues solicitou vista no projeto, para ganhar tempo, e ele não pôde ser votado naquela legislatura.

A mulher brasileira teve que esperar mais alguns anos. Nesse período são fundadas várias entidades congregando as militantes feministas. No Brasil, na primeira vez que as mulheres conseguiram o direito de votar, os seus votos foram anulados. A Comissão de Poderes do Senado Federal, no ano de 1928, ao analisar as eleições realizadas no Rio de Grande do Norte naquela ocasião, requereu em seu relatório a anulação de todos os votos que haviam sido dados as mulheres, sob alegação da necessidade de uma lei especial a respeito. O projeto que concedia esse direito à mulher norte-rio-grandense era de autoria do deputado Juvenal Lamartine de Faria, o mesmo que, como relator do projeto de 1921 na Câmara Federal, havia dado parecer favorável ao pleito, que fora aprovado pelo Legislativo Estadual e sancionado pelo governador José Augusto Bezerra de Medeiros. O Rio Grande do Norte portanto foi primeiro Estado brasileiro a conceder o voto à mulher. As duas primeiras mulheres alistadas como eleitoras no Brasil foram as professoras Júlia Barbosa, de Natal, e Celina Vianna, de Mossoró, ambas do Rio Grande do Norte. Também seria potiguar a primeira prefeita do Brasil, Alzira Teixeira Soriano, eleita no município de Lages, em 1928, pelo Partido Republicano Federal.