Para escrever, vale
qualquer subsídio. Um, entre vários demais, tem consistido
em traduzir com
palavras, velhos postais, principalmente de São Mateus. É interessante como a
terra em que se nasce penetra na gente e ocupa tantos espaços. Como dá gosto,
falar dela e decantá-la. Protestar contra o descaso que a vitima e a todos em
consequência, também.
São velhos postais, alguns
com cerca de cem anos, amarelados pelo tempo, mas ainda nítidos. Observando-os,
podem-se divisar detalhes que não identifico, entretanto, ou que mesmo tendo
ouvido falar, não tenho precisão.
Em busca de
esclarecimento, a primeira pessoa que me ocorre acorrer é mamãe, ela que sempre
gostou de contar o que sabia, - até de falar... nem sempre bem de certos
personagens... - ao mesmo tempo, em que me surpreendo ao sentir explodir em
mim, grande desilusão: não vou nem mostrá-los a ela, o que em outro tempo,
traduziria grande alegria, alegria não causará. Sua visão anda em muito
reduzida, não perceberia talvez o que é mais evidente, quanto mais os detalhes
e quedaria triste. Não vou fazer isto,
aliás, nem posso.
A televisão mostrava nesta
manhã de 15 de dezembro de 2013, como se expressava o apresentador: o enterro
de Nelson Mandela. Acho enterro uma palavra demasiado agressiva, prefiro falar
em sepultamento.
Ao acompanhar aqueles
momentos seguidos pela inteira população da África do Sul e expressivo número da
que ocupa o resto do mundo fui refletindo do quanto é verdadeiro que a morte é
a única certeza que temos, de como ela chega em dia e hora que não sabemos, não
tem idade para acontecer, ou se faça depender de qualquer detalhe. Simplesmente,
chega.
E se fez presença na minha
lembrança, uma dessas máximas que sempre me acompanham: pode ser que não passe duas vezes pelo mesmo caminho. Importa fazer o
que deve ser feito, sem adiar ou esquecer.
A história precisa ser
escrita e preservada. A geração que me precede, do lado de papai, inclusive
ele, todos já se foram. Quando tia Martha morreu, foi a última, sem que eu lhe
tenha feito todas as perguntas que pretendia, tive a sensação de ver uma porta
que se fechou. Do lado de mamãe, tia Idatília, 100 anos, a
professora, há três meses nos lançou seu último beijo de despedida, também não
travei com ela, o diálogo que enchi de muito carinho e amor, que cuidadosamente
preparei. Tio Durval, menino levado que vovó Rosinha surrava, (faz parte da
biografia dele) esperto, brincalhão, gozador, inteligente, se rende às
consequências dos seus 104 anos em Curitiba onde mora com o filho único, de
quem pessoalmente e de toda família recebe muito carinho.
Todos deixaram lembranças.
No âmbito da nossa vida familiar tiveram mais expressão que Mandela para o
mundo. É que em família, tudo que se vive vale mais.
27 anos numa prisão,
expressiva parcela de sua vida, sobreviveu o líder sul africano. Recusou-se a
não estar entre grades, enquanto ser livre representasse apenas ter faculdade
de poder ir e vir, mas calado.
Mandela deixa para seu
povo e para toda a humanidade um legado de altruísmo, de luta e definição clara
de que todos os homens nascem livres, devem ser respeitados e são iguais.
Como tudo passa e todos passam,
Mandela passou. Passaram tantos, e ai, vamos
que vamos, passando também nós.
Façamos o que pudermos.
Parece pouco? Não, o passado importa. É preciso também saber o que aparece,
numa fotografia do Porto de São Mateus, até meio em cima do cais, noutra, só na
água, seria o tal vapor que levava o pessoal ao Rio de Janeiro? O que será?
Porque:
O
que será o amanhã?
Responda quem puder.
O que irá me acontecer?
O
meu destino será como Deus quiser.
(João
Sérgio)
Pronto. Fiz registros e ponto
final.
Marlusse Pestana
Daher
Vitória, 15 de
dezembro de 2013. 11:53
A foto que ilustra o texto foi colorida pela arte de um mateense, hoje, Pastor Matheus Ernesto dos Santos (Recife).