sexta-feira, 12 de julho de 2013

A POESIA DE KARINA FLEURY

Karina Fleury
Ilha
ia só na vi-
da, forte
sem par
e de só ca-
minhocar so-
mente ilha-
do ente vi…
Inconsciente
tenho sonhado:
corpos nus, suados, colados
como outrora os nossos entrelaçados
hoje, (en)fadados, a sós.
Palco
arrepio palavras
enquanto você,
falácia sem sal,
encena seu ato final.
Rodovi(d)a
No calor do teu abraço
Sou tudo, sou nada
Me faço, me desfaço
Puta, amante, namorada
Sua voz me chama
Como é mesmo teu nome?
A chama nos consome
Suor, lágrima, solidão
Uma cotovia casquina lá fora
É hora de voltar para a esquina
Após uma noite, um dia
Após um dia, um outro
Eta vida de louco, Meu Deus!
Fugaz
o que há por trás do eu
é o instante-nunca
que em você jaz.


Perguntei a poetisa Karina Fleury, qual o  nome dado ao tipo de poesia que comete. Como ela, também o poeta Jorge Elias Neto, por exemplo, além de outros.

Eis a resposta:

- Não classificamos assim textos como os que escrevo ou Wilbett Oliveira ou Jorge Elias. Na verdade, não estamos muito mais preocupados com as tais nomenclaturas. Buscamos sim reconhecer alguns traços, influências de leituras do autor...  O pós-modernismo, como expressão literária vive sob o signo da multiplicidade: é um monte de estilos, vivendo sem briga, num mesmo saco. Não há mais hierarquia.

"A literatura do século XX e também do XXI, num diálogo constante e produtivo com as crises do homem, levou os escritores a experimentarem, entre outras aventuras de risco, diversos tipos de droga, na tentativa de alargar a visão e o estar no mundo e, em decorrência, manipular novos tipos de linguagem" . (Paulo Venturelli). Acho que é mais ou menos isso, 

EXPERIÊNCIA NO PROJETO RONDON

A rua se desenhava subindo o morro, algumas casinhas foram construídas à sua margem, humildes, pequenas, mas bem juntas uma das outras como para se sustentarem e sentindo-se unidas terem coragem de enfrentar os olhares de quem passando as fixasse.

O casebre de João Lúcio e Auristela era ainda menor, ainda mais pobre e fora erguido na baixada, a bem uns 15 m do alinhamento. E descendo é que fui encontrá-los.

João Lúcio, solícito, abriu as portas... do coração é claro, como quem recebe gente ilustre porque a porta da casa está sempre aberta, e até três bacorinhos me pareceram muito familiares ali, naqueles 15 metros quadrados de imensa pobreza. A um canto, o fogão onde o fogo não ardia e panelas nada cozinhavam.

Auristela, de cócoras, numa água que nem antes me pareceu pudesse          ter sido limpa, banhava Ciciane. Olhou-me ao entrar, sem hostilidade, mas também sem alegria. Uma face que realmente, se cuidada, pareceria muito bonita. Enxugou Ciciane, deixando-a sobre a enxerga a contemplar os porcos que comiam casca de manga no chão.

Eu me pus a pensar se haveria revolta naquela vida, entusiasmo era evidente que  não, ou o que havia. Vestiu uma calcinha em Eliane e passou com a mesma tristeza nos olhos e depois nas palavras a falar comigo que a esta altura entusiasmava João Lúcio a obter sua carteira profissional e lhe dizia: quem o vir com uma carteira dessa na mão, vai ver que você é um trabalhador, protegido pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social. Eu acreditava que era mesmo assim.

- É, mas eu vivo de carregar água, não tenho “registro”. No tempo das eleições, lutei para conseguir, mas não consegui”. E noutro tom, resignado e sincero: “Eu acho que não tenho sorte”!

Senti uma pena imensa, mas uma luz brilhou em mim e lhe respondi: não, João, talvez você não tenha sido esperto, isto é, não chegou primeiro na fila. Nessas circunstâncias, a gente tem que chegar uma hora antes e não deixar que ninguém passe na frente da gente.

Ele sorriu convencido: “sabe que é isso mesmo”?

Eliane e Ciciane também não estão registradas e João não tem dinheiro para isso, neste dia, nem para comer havia alguma coisa.

Quase me arrependi de falar que o fotógrafo até fizera uma diferença de Cr$ 1,50 no preço de seis fotografias para que todos tirem sua carteira profissional e que S. Nenê cobrará só Cr$ 8,00 por registro, para que ele pudesse registrar as filhinhas por quem notei ter muito carinho.

No final, meus braços caíram sem alento, só a voz se conservou.

-É, João, infelizmente, eu não tenho mais a lhe dar. Que Deus abençoe você, sua família, sua casa. Até logo!

Atrás de mim, ainda ouvi o clássico sertanejo: seja feliz...

Por dentro eu dizia: abençoa mesmo, dá um jeito, meu Deus, João não pode ser decepcionado, se alcançar a profundidade do meu voto.

Como é maravilhosa a ação do nosso Projeto Rondon, estamos descobrindo problemas, poderemos solucioná-los?