sexta-feira, 21 de junho de 2013

BEATRIZ, UMA MULHER, UM NOME, UMA PERSONALIDADE


No sétimo dia... 
Quando morre uma pessoa, para onde vai tudo que ela sabe? Esta frase ouvida de um personagem de novela, cujo título não me lembro, propicia-me refletir, quando é o caso, como o caso é, o da morte de Beatriz.

Quando a chamava não só Beatriz, mas Beatriz Abaurre, ela ria divertida, porque o nome de família, por positiva gozação, eu o pronunciava bem cheio e mais compassadamente. Na escrita, não dá para traduzir, só imaginar. Ria sempre, aquele riso que a caracterizava, sorriso bem largo, igualmente divertido, cujo ressoar ainda repercutirá  por muito tempo aos meus ouvidos.
Com a familia no dia do lançamento
de sua biografia
Obstinada, esguia, inteligente, destacou-se sempre, não só pela projeção social alcançada, mas pelos dotes musicais e artísticos dos quais era dotada; quando por mais de uma vez presidiu o “Conselho Estadual de Cultura”, função que levou às últimas consequências, lutando por manter íntegro o entorno do “Penedo” na Baia de Vitória e dos diversos monumentos tombados em todo o Estado. Foi nesse tempo que nos aproximamos, visto que eu dirigia o Centro de Apoio do Ministério Público que trata do ambiente natural, do patrimônio histórico e artístico. Lá, chegou a passar longas horas de diversas tardes, trocando ideia e valendo-se do mesmo apoio que lhe podia dar, nas lutas que abraçava.

A perda do único filho varão causou-lhe aquele baque terrível que provam todas as mães, em igual circunstância, até pela forma trágica com que aconteceu. Mas se afirma que foi exatamente tal tempo de dor a despertar nela, a excelente escritora e poetisa que se revelou e que desde então não parou de produzir.

Com Wanda Alckmin e sua biógrafa,
Maria do Carmo Schneider
Falava sempre com orgulho das três filhas, Marta, Heloisa e Patrícia. Bem custodiada pelo marido, embora não se caracterizasse como aquele tipo de mulher que carece de tanto, antes, era muito bem senhora de si, independente no intelecto e até financeiramente.

Ao lado dela, ingressei na Academia Feminina Espírito-santense de Letras. Desde então, nosso convívio foi muito próximo, ao ponto de me sentir particularmente distinguida com particular afeto seu. Antes, na sua plena forma, depois, quando foi sucumbindo aos poucos, o que ela mesma contava. O longo período, que a manteve sob tenso cuidado médico, impediu-me de vê-la o que não aconteceu sem sentido lamento da minha parte. Tivemos apenas uma conversa ao telefone. Agora, se é possível saber, ela bem o sabe que não foi porque não quis.

Permanece lá bem no alto, no alto da Ladeira “Sagrado Coração de Maria”, um apartamento, mirante de esplêndida paisagem, na qual se incluem, as barcas ancoradas no Iate, a ponte e a Ilha do Frade, a Ilha do Boi, a Terceira ponte, o contorno do canal com seus edifícios de apartamentos, a Curva da Jurema, todos, agora privados de um olhar cotidiano que lhes era projetado em êxtase, mas que também enchiam de beleza a alma de Beatriz. Naquela mesma morada, um piano na sala se calou, a viola não saiu mais do seu estojo, debruçada sobre aquela mesa, não se vê mais aquela mulher inteligente que disparava versos e escrevia contos e crônicas, estruturava e editava livros, depois publicava.

Não se disque mais aquele número de telefone que emudeceu, não se conte mais com o concurso daquela personalidade bem dotada, capaz de fazer tanta coisa acontecer, não a chamemos mais pelo nome, não virá nenhuma resposta, mas seu legado grande e valioso nunca deixará de ser subsídio, de modo que tudo o que sabia permanece à disposição de quantos precisarem e dele se quiserem valer.

É assim, tudo tem seu tempo, as pessoas também. À sua hora, cada pessoa é a única capaz de dizer, já vou, sejam quais forem as circunstâncias, o fato que a determinou.

A dor dos que ficam vai doendo, até...

Descanse em paz, querida Beatriz!

Marlusse
21 de junho de 2013 17:22